6 de novembro de 2009

UMA QUESTÃO DE... NACIONALISMO

Quando ouço discursos de generais americanos, assusto-me. Nos filmes e séries eu compreendo toda aquela treta pró-americana, patriótica e tal, porque sei que aquilo é uma máquina de fazer dinheiro, um gigantesco aparelho de marketing de tal forma que estamos todos a copiar agora a cultura americana, ou melhor, o estilo de vida americana. Mas assusta-me o patriotismo da máquina de guerra americana, tal como me assusta a religiosidade extremista. Não obstante estes tipos, os americanos, andarem a dizer crer em deus, parece-me que a sua crença é outra: América.

Ontem, na TV, um almirante a ser entrevistado por Jon Stewart disse que os seus soldados são patriotas, amam o país e dariam a vida por ele. Deus do céu!!!

Na América há racismo, brancos que odeiam pretos e vice-versa, mas mais facilmente, parece-me, um afro-americano (como ridiculamente são chamados os pretos) bombardearia a África em nome da White America do que arriscar a ser chamado de mau americano, não dando a vida pelo país. (Obs.: convenhamos que nem todos eles são assim tão bestas).

Mas não só os americanos são assim tão loucos ou sofreram bastante lavagem cerebral para serem patrioticamente estúpidos, não, todo o mundo é assim. O tópico chegou-me à cabeça por causa de um deles, porém não estou a reflectir sobre eles em particular, mas sobre a humanidade.

Já ouvi pessoas a dizerem: tenho orgulho em ser português, tenho orgulho em ser preto, tenho orgulho em ser drogado, tenho orgulho em ser puta, entre outros, que fico admirado. Porque moi ici não tenho orgulho em ser nada. Sou guineense, sou preto, mas não tenho orgulho em ser nada disso (entretanto, não se confunda não ter orgulho com ter vergonha). O único orgulho que eu tenho é de ser quem eu sou e como o sou. Podia ter nascido marciano, azul ou transparente, e embora saiba que isso contribuiria para me formar, não seria a minha essência, tal como a minha pele e o sítio onde nasci não a são.

Eu amo o meu país, Guiné-Bissau, porque deu-me o berço e sinto-me melhor nele do que em qualquer outro sítio do mundo, mas amo Portugal, porque nesta altura é a minha casa e tenho o dever de gostar e cuidar da minha casa para viver nela melhor, mas eu não atacaria a ninguém e nem daria a vida por nenhum deles. (Bom… se neste momento a América resolvesse atacar Portugal provavelmente eu estaria nas fileiras dos que iam levantar a arma contra, não por patriotismo mas simplesmente porque intrusos me estão a invadir a casa com intuitos impróprios.) Por que razão devia ter orgulho em ser preto ou em ser guineense, se não escolhi ser nenhum deles? E por que razão teria orgulho em ser americano ou branco se de igual modo não teria escolhido sê-los? Eu tenho orgulho em fazer este blog, eu tenho orgulho em assumir os meus pensamentos e palavras (mesmo sabendo que o que estou agora a dizer um dia poderá vir a custar-me sendo erroneamente interpretado), eu tenho orgulho dos meus (embora não os tenha escolhido também, mas são gentes e não coisas ou ideologias), mas orgulho da raça ou nacionalidade, não, não tenho.

Fala-se globalização, mas tal nunca irá acontecer (pelo menos em termos de humanismo e não de controlo económico), porque nós não pensamos no círculo do universo, mas em círculos mais pequenos, individuo, famílias, parentes, amigos, grupos, classes, bairros, distritos, país, continente, para em último chegar a humanidade… Ok!, eu sei que há grupos que já formaram comissão de boas-vindas para os aliens, porque são criaturas vivas, mas também esses são tão progressivos que nem vêm o que acontece aos seus vizinhos.

O patriotismo ou o nacionalismo é a capa de inocência com que envolvemos a xenofobia e o racismo. Um judeu ataca a palestina por nacionalismo; o americano é ensinado a odiar o árabe por nacio… por petróleo; a Frente Nacional quer correr com os estrangeiros por nacionalismo; um hooligan ataca um francês num jogo de mundial por… estupidez.

Uma coisa que admiro nas Testemunhas de Jeová é que os desgraçados não saúdam a bandeira, nem cantam hinos nacionais porque perceberam que isso é idolatria, uma religiosidade não declarada.

Eu recomendaria aos activistas one-worldianos que se concentrassem mais em curar o nacionalismo, pois revela-se mais perigoso que as questões dos círculos menores, pois é fonte que as alimenta e legitimiza.

3 de novembro de 2009

PENSAMENTOS INEXACTOS - CAP. V


REMAR CONTRA A MARÉ OU SEGUIR A MANADA


O homem é um ser social, ensinaram-me na escola, nasce, cresce, reproduz (ou não) e morre.

Lembro-me que tive de fazer uma composição sobre o assunto há três anos, na oitava classe [1995], o tema era: o homem deve ou não viver sozinho e isolado dos outros. É claro que eu disse não, e, entusiasmado, lá me pus a discorrer, explicando as razões por que achava que o homem não devia viver sozinho. Eu sei que ainda me faltam muitos anos para poder usar legitimamente a frase: se eu soubesse na altura o que sei agora. Mas, se eu soubesse o que sei, se calhar não responderia que o homem deve viver com os outros… Não!, provavelmente não o faria, porque se o fizesse levava um zero e chumbava à disciplina. Educação Social, chamava-se ela. Era uma disciplina que veio para substituir uma outra de cunho político-partidário: Formação Militante. Ambas tinham como objectivo criar homens capazes de se integrar na sociedade, mas eu, pessoalmente, não aprendi nada com elas, porque as únicas vezes que falava das coisas que me ensinaram eram nas aulas com o professor ou com os colegas quando a prova se aproximava.

O homem é ser social, nasce dentro de uma sociedade e é ensinado pelas regras da dita, e o ensino é de tal forma, que quando não entramos em choque com ele logo cedo acabámos por aceitá-lo quase como um dogma e nunca rechaçamos. Hoje, eu podia ter respondido que o homem deve viver isolado dos outros e justificado que os outros, os antecedentes, são quem corrompe o homem com os seus ensinos e as suas formas de viver. Voltaire era um homem asocial, na medida em que não aceitava as tretas da sua época, era um homem que viveu sozinho. O homem não faria mal a ninguém se não fosse ensinado a fazer mal, a copiar o que vê, ou tentar não ficar para trás na grande corrida da vida, e como o jogo não é leal, ele também não sente a obrigação se o ser.

Os homens que são diferentes, que não querem ser como os demais, nunca triunfam. Cristo andava a pé, arrastando consigo uma multidão de desgraçados, supostamente com sandálias gastas, todo suado e sujo, embora as gravuras o mostrem sempre com um branco imaculado, mas quem estaria assim sempre limpo andando no deserto os quilómetros que ele andava? Se nem tinham água para lavar as mãos, os seus discípulos chegando a comer com elas sujas, onde sairia com ela para tomar banho? Não admira que o mandassem crucificar! Um maltrapilho fedorento a dizer-nos que somos sujos? Olá, olé! Cristo era diferente, resultado: morte na cruz; Sócrates era diferente, resultado: bebeu cicuta; Galileu era diferente, resultado: então, por que não ser igual?; Rambo era diferente, resultado: em todos os três filmes nunca teve paz. Para quê ser diferente se todo o mundo é igual?

Somos julgados por sermos diferentes; enjaulamos pessoas porque não pensam igual a nós, enjaulamo-las porque não ouvimos as vozes que ouvem, e seguimos outras pela mesma razão (intrigante, não?); negamos oportunidades às pessoas porque não têm um bom apelido ou um bom padrinho; despedimos funcionários porque não concordaram connosco; não encontramos trabalho porque não fomos à entrevista de gravata (pelo menos foi isso que li num livro de Dale Carnegie); resumindo: temos de ser o que querem que sejamos, se não o formos, emularemos Camões: miseráveis vivos e talvez glorificados depois de mortos, e isso se deixarmos alguma coisa de valor. Mas quantos têm a oportunidade ou a capacidade de deixar coisas de valor?

Geralmente os que deixam coisa de valor são aqueles que não se deixam levar pela maré, são os que remam no sentido contrário, às vezes são chamados de revolucionários, outras de visionistas, algumas de artistas e algumas outras de loucos. Mas na sua maioria só vem o reconhecimento quando já não precisam dele. E o que se quer é viver, aqui, enquanto vivos, o que vem depois da morte fica fora do nosso conhecimento. 


Então o que devemos fazer para vivermos em paz, seguir a manada ou fazer um caminho solitário? Se formos pela primeira, corremos o risco de ser do tipo que Gabriel o Pensador acusou num dos seus versos: pessoas como eu, conheço mais de mil; se optarmos pela segunda ou acabamos hippies ou internados num manicómio. Será a melhor saída a hipocrisia, aceitar o que convém quando convém, mesmo que isso vá contra o nosso princípio? 


Por outras palavras, será que devemos todos ser maquiavélicos, adequando-nos e adequando os meios, não tendo princípios e apenas olhando para os fins?

28 de outubro de 2009

CAIM E ABEL

Um clássico da literatura religiosa, sem sombra de dúvida. Não fosse a mistificação ou a sacralização dos mitos antigos tínhamos aqui simplesmente uma alegoria ao conflito entre irmãos motivado, na maior parte das vezes, pelos próprios pais, dando mais afecto a um do que ao outro – um caso que Freud certamente analisaria (se calhar até analisou, eu cá não sei) se não estivesse muito ocupado a resolver os seus pendentes com os pais; ou então simplesmente uma imagem do choque das primeiras sociedades organizadas humanas: os nómadas (pastores) e os sedentários (agricultores); mas não, não podia ser assim tão simples, tinha que se meter um deus no meio de tudo para apimentar e apropriar-se da lenda.


Caim e Abel é tão simples (embora plurissignificativo) que passaria um bom par de tempo antes que eu voltasse a escrever sobre o tema, porém eis que me surgiu um motivo: Saramago. Não li este novo livro de Saramago ­– Caim –, nem lhe consigo imaginar o enredo, porque já me surpreendi com a sua escrita pelo menos três vezes. E nem sequer isso me poria a falar de Caim e Abel, se na equação não tivesse entrado outro elemento: a Igreja. 

E tenho aqui um Caim e um Abel: Saramago (para a Igreja certamente ele é Caim – considerando este como o obscuro) e a Igreja (o puríssimo – na versão da mesma). 

Eu sou declaradamente ateu, portanto sou a favor quando se ridiculariza as crenças e crendices da Igreja, e, como homem supostamente livre, defendo que cada um deve expor as suas ideias desde que isso não signifique fazer mal a outrem. Embora pareça que esteja com isso a dar razão à Igreja por se manifestar desagradado com Caim – o livro (e volto a salientar, não sei o que diz o livro; e só o vou ler daqui a quatro anos quando a poeira assentar, pois não gosto que as polémicas me afectem a leitura) – sentindo-se atacada por Saramago, reclamando para si o direito sobre Caim, quando na verdade essa história foi emprestada de outras lendas tal como grande parte das histórias bíblicas; a Igreja sente-se desrespeitada por Saramago porque este põe em questão uma crença milenar, criada e solidificada pela própria Igreja que durante todo esse período obrigou os outros a terem-na como certa. A bem ver, no entanto, a Igreja não tem esse direito, porque foi ela que atacou primeiro e subjugou os outros, o que Saramago fez foi apenas sacudir-se desse jugo e tentar dar a outras pessoas motivos para fazer o mesmo.

Caim cultivava um campo onde Abel levava o seu rebanho pastar, razão por que o matou. A Igreja tem um negócio que Saramago está a atacar, e está a tentar este último, e ainda continua a falar mal de Caim? Que hipocrisia.

A Igreja já devia ter percebido que não é ela a senhora, que o século de obscurantismo devia já ter acabado e que embora continue a manipular milhões de mentes ainda tem mentes que dispensam as suas opiniões; aliás, o que é a Igreja senão um grupo de pessoas que, tal como os políticos, gerem um negócio de controlar pessoas por benefício próprio? E se somos livres para escolhermos os nossos políticos (na definição de Eça de Queirós), por que não podemos escolher as nossas leituras?

Aliás, a Igreja, se não fosse precipitada, se tivesse percebido que já passou a época do Index Librorum Prohibitorum, saberia que as suas polémicas acerca da arte só freiam alguns sujeitos descerebrados que sem orientação não andam e que os restantes vão à procura, nessa arte proibida, do motivo da sua proibição, o que a veicula ainda mais. 

Que vende mais hoje do que uma polémica? Nesse sentido, deus salve a Igreja!

20 de outubro de 2009

DEUS E LÓGICA NÃO COMBINAM

Vezes e vezes recebi um mail, em todas as formas possíveis de mensagens correntes, em powerpoint, jpgs, simples textos, recomendando mandar seguir para não ter azar posteriormente. Hoje, apanhei de novo esse texto e resolvi responder.A primeira parte disto trata-se do referido texto. A segunda a minha resposta.


PRIMEIRA PARTE

Um professor ateu desafiou seus alunos com esta pergunta: – Deus fez tudo que existe? Um estudante respondeu corajosamente: – Sim, fez!– Deus fez tudo, mesmo? – Sim, professor – respondeu o jovem. O professor replicou: – Se Deus fez todas as coisas, então Deus fez o mal, pois o mal existe, e considerando-se que nossas acções são um reflexo de nós mesmos, então Deus é mal. O estudante calou-se diante de tal resposta e o professor, feliz, se vangloriava de haver provado uma vez mais que a Fé era um mito. Outro estudante levantou sua mão e disse: – Posso lhe fazer uma pergunta, professor? – Sem dúvida, – respondeu-lhe o professor. O jovem ficou de pé e perguntou: – Professor, o frio existe? – Mas que pergunta é essa? Claro que existe, você por acaso nunca sentiu frio? O rapaz respondeu: – Na verdade, professor, o frio não existe. Segundo as leis da Física, o que consideramos frio, na realidade é ausência de calor. Todo corpo ou objecto pode ser estudado quando tem ou transmite energia, mas é o calor e não o frio que faz com que tal corpo tenha ou transmita energia. O zero absoluto é a ausência total e absoluta de calor, todos os corpos ficam inertes, incapazes de reagir, mas o frio não existe. Criamos esse termo para descrever como nos sentimos quando nos falta o calor. E a escuridão, existe? – continuou, o estudante. O professor respondeu: – Mas é claro que sim. O estudante respondeu: – Novamente o senhor se engana, a escuridão tampouco existe. A escuridão é na verdade a ausência de luz. Podemos estudar a luz, mas a escuridão não. O prisma de Newton decompõe a luz branca nas várias cores de que se compõe, com seus diferentes comprimentos de onda. A escuridão não. Um simples raio de luz rasga as trevas e ilumina a superfície que a luz toca. Como se faz para determinar quão escuro está um determinado local do espaço? Apenas com base na quantidade de luz presente nesse local, não é mesmo? Escuridão é um termo que o homem criou para descrever o que acontece quando não há luz presente. Finalmente, o jovem estudante perguntou ao professor: – Diga, professor, o mal existe? Ele respondeu: – Claro que existe. Como eu disse no início da aula, vemos roubos, crimes e violência diariamente em todas as partes do mundo, essas coisas são o mal. Então o estudante respondeu: – O mal não existe, professor, ou ao menos não existe por si só. O mal é simplesmente a ausência de Deus. É, como nos casos anteriores, um termo que o homem criou para descrever essa ausência de Deus. Deus não criou o mal. Não é como a Fé ou o Amor, que existem como existe a Luz e o Calor. O mal resulta de que a humanidade não tenha Deus presente em seus corações. É como o frio que surge quando não há calor, ou a escuridão que acontece quando não há luz. Texto que circula na Internet. Autor desconhecido.




SEGUNDA PARTE

Os colegas ficaram todos embasbacados com a resposta do estudante e começavam já a pensar se não deviam converter-se para a religião do brilhante colega que conseguiu reduzir a zero as pretensões de superioridade ateia do professor. Mas antes que tivessem oportunidade de o fazer, levanta-se um outro aluno e pede licença para falar.– Primeiro, reconheceria como bom o argumento do meu colega, se não fosse falacioso. Ele falou da inexistência do frio e do escuro, dizendo que a física não os estuda, mas apenas aos seus opostos, o calor e a luz, respectivamente. Depois falou da inexistência do mal no mesmo termo, classificando o mal como um conceito físico e não moral. Não devia estabelecer uma comparação directa entre os dois conceitos, pelo menos se não for de forma alegórica. Porém aceitando a sua justificação de que o mal é a ausência de Deus prova-se a inexistência deste pelas mesmas razões pelo colega apresentadas: Nós podemos medir e classificar o mal, através de estatísticas, dizendo quantos foram mortos, quantos foram assaltados, quantos foram violentados, classificando o tipo de morte, de assalto e de violação, podemos contabilizar de diversas maneiras as consequências do que chamamos de “mal”, e durante essa contabilização, podemos incluir autocarros explodidos, cidades invadidas, inocentes mortos em nome do sempre presente Deus, podemos incluir crianças violadas, pessoas intrujadas, casamentos e famílias desfeitas em nome de Deus, podemos incluir paranóias agudas, roubos de identidade e de liberdade de pensamento em nome de Deus, de tal maneira que Deus e Mal seriam sinónimos e não opostos como o colega quis mostrar. E se, o mal é ausência de Deus, e sendo que a toda a hora constatamos a presença do mal, significa que Deus nunca está presente, pois o escuro desaparece com a luz, e se Deus equivale a luz, não poderia de forma alguma existir o mal. Além de mais, a existência do mal é uma negação à omnipresença de Deus, sendo que Deus seria um mentiroso por se ter afirmado omnipresente.



Texto de Marinho de Pina




TERCEIRA PARTE


E o colega respondeu: – [alguém?]...

14 de agosto de 2009

ERÓTICO OU PORNOGRÁFICO - no plano literário



Há uns bons pares de anos, na Inglaterra, um senhor chamado John Cleland resolveu escrever um livro pornográfico e imoral, contrário aos costumes de bons cristãos e civilizados - na altura -, o que lhe valeu a cadeia, - hoje -, um clássico da literatura erótica, e não só.

Cleland descrevia no seu livro aspectos sexuais, considerados libertinos, mas que eram mais praticados pelas próprias pessoas que publicamente os condenavam, estou a falar da classe média alta. Ainda hoje, as pessoas que mais se entretém com práticas sexuais de toda a sorte, que realizam grandes orgias e poderiam ser os mais sexualmente pervertidos se escrevessem duas linhas das práticas em que se envolvem, são os da classe alta, pessoas endinheiradas, pois têm-no... o dinheiro... são eles os políticos, os moralistas, os religiosos, os pais defensores da moral, etc. Enquanto estão a dar cara na televisão, nos jornais, atacam o sexo com todas as armas que têm, cantam a moral e glorificam a abstenção, mas longe dos olhos da média, a história já é outra.

No livro de Cleland, são visto nobres senhoras e os seus nobres senhores reduzidos a nada diante da fome sexual, ou da satisfação dessa fome, contrariando o adágio de que apenas a morte iguala os homens. A classe média alta pode fazer o que lhe dá na gana, mas até estas satisfações mais básicas querem e tentam retirar aos mais desfavorecidos na hierarquia das castas.
Ontem, Fanny Hill, As Memórias de uma Mulher de Prazer, era considerado um livro imoral e pornográfico, não obstante tivesse sido um best-seller na mesma época em que foi condenada, atestando desta maneira a hipocriasia que norteia os julgadores.
Eu não cheguei a ler Fanny Hill, só vi filmes, três versões, o que li foi A Filha de Fanny Hill, de autor anónimo, mas que se crê ter sido escrito pelo próprio Cleland, visto quando foi libertado por causa do Fanny Hill lhe ter sido imposto não voltar a escrever coisa do género, e, segundo o prefaciador, o estilo dos dois é similar.
Se o estilo é similar, sendo delicioso A Filha de Fanny Hill, e sendo uma sequela, presumo que Fanny Hill também seja delicioso. Ainda hoje deve haver certamente quem chame a este livro de pornográfico e imoral, (eu pessoalmente não sei distinguir a literatura, em prosa, pornográfica da erótica), mas se pornográfico consiste em utilização dos vocábulos "xungas", tal como caralho, cona, etc, então o livro não é, e muitos outros livros que não tratam de sexo, são pornográficos, aliás, o livro nem usa termos anatómicos, como pénis, vagina, e companhia, mas fala de lanças, botãos, heranças, e outros. O livro foi um dos mais éróticos que já li, senão o mais, mas vem numa linguagem que não chocaria nem a madre Teresa.

Na altura em que li A filha de Fanny Hill, li muitos outros, alguns títulos colhidos do Sete Minutos de Irving Wallace, um dos meus escritores preferidos... estava em constrante procura de materiais para as minhas sessões de onanismo... e, sim, concordo quando dizem que alguns livros são pornográficos e imorais (embora continue sem saber o que isso quer dizer), li o Trópico de Câncer ou do Capricórnio, já não lembro qual deles (vi o título num filme com Robert de Niro, Cabo de Medo e depois no Sete Minutos), a ideia era ler a trilogia de Henry Miller, mas fiquei-me nesse porque era simplesme sem sentido, palavras atiradas à toa no meu entender. O livro não era erótico, por não estimulava nada, não era literatura porque eram só palavras ordinárias e referências ordinárias, embora isso não significa nada, pois li um tal Bobowski, ou não-sei-quê (não me lembro do nome), Mulheres, esse era ordinariéssimo e vulgar, mas era boa leitura e conseguia ser erótico.

Agora vou voltar ao Fanny Hill. Lembrei-me de escrever este post, porque há dois dias, vi, coisa estranha, no comboio quatro senhoras a ler o mesmo título, Fanny Hill, os livros eram os mesmos, ou seja, da mesma editora, o que me fez pensar: Fanny Hill está em voga outra vez e a vender como o diabo, e por quê?, porque as pessoas torcem o nariz quando se fala de sexo, mas aguçam os ouvidos. Eu não leio livros eróticos simplesmente pela literatura e prazer de ler, como já referi, mas pelas minhas práticas solitárias propriamente, e fiquei admirado que, tal como ninguém gosta de ver pornografia em público, as senhoras estivessem a ler no público o Fanny Hill. Se elas estivessem a ler Milos Manara seria mais agressivo do que estarem a ler Cleland? É esta a diferença entre a pornografia e o erótico? Manara é porno, porque tem imagens? Nos filmes eu sei que quando não há penetração explícita (não falemos de sexo explícito que isso é para enganar), diz-se erótico, mas na literatura, como classificar? Em banda desenhada, como distinguir o porno do erótico? Engraçado, já em banda desenhada eu leio mais o erorismo pela arte do que propriamente pela recolha mental de material.

E Agora, outra questão, qual é o ponto deste post, juro que não sei. Mas a ditas senhoras no comboio, eram mais corajosas do que eu, a não ser que estivessem a pensar que ninguém saberia pelo título do conteúdo do livro, tendo em conta que a maioria só vê televisão e só conhece as bibliotecas pela fachada, e embora eu pensasse que estou quase livre dos preconceitos sexuais, não estou, pois fiquei chocado naquela altura que senhoras estivessem a ler Fanny Hill em público.

4 de agosto de 2009

A HOMOSSEXUALIDADE É DOENÇA

Estive a ler Yvan Lerger, Desvios Sexuais, no capítulo onde ele fala de homossexualidade, refere-se a essa questão como se fosse uma doença. Eu não sou psicólogo, mas confiro-me autoridade, ou pelo menos bom senso, suficiente para contrariar esse senhor, autoridade esta apoiada nos seguintes artigos (só de exemplo): este e mais este.


É ridículo considerar homossexualidade uma doença só porque a tendência geral é a heterossexualidade. Aliás, se formos ver bem, então doentes neste planeta seriam os honestos, altruístas e ateus, porque somos ensinados que o mundo é cruel e portanto temos de sê-los também para poder sobreviver. Mas isso não é assunto para este capítulo.

Entretanto, vou dar um desconto ao Dr. Yves considerando a época em que escreveu esse livro e mentalidade que imperava nessa altura, vou fechar os olhos e não ver que por causa de autoridades, moralistas ou científicas, tendenciosas é que o nosso mundo continua estagnado em preconceito vários. Bem como Pierre Boulle n’O Planeta dos Macacos com maestria ridicularizava: uma sociedade de orangotangos que mandam na ciência com dogmas e tretas não permitindo que se chegue ao passo seguinte porque têm medo de ver a sua autoridade derribada.

A homossexualidade (isto para alguns idiotas preconceituosos que se julgam sábios e andam por aí, facundos, a pregar preconceitos contra os homossexuais) não é doença, não significa instabilidade mental, significa simplesmente escolha, ainda que inconsciente. As pessoas não nascem homossexuais, não nascem heterossexuais, não nascem coisa alguma, simplesmente são educadas ou fazem a sua escolha por motivos diversos algures no caminho da sua vida enquanto se formam e se consolidam. Homossexualidade é doença? Ridículo.

Não bastam os religiosos, com as suas cruzadas fictícias, a chatearem os homossexuais… não bastam os hipócritas que curtem bué um show de lésbicas, mas atacam os homossexuais masculinos, porque são contra a homossexualidade… não basta o medo de ostracismo pela sociedade… ainda vêm psicólogos ou sexólogos a escreverem livros com finalidade de instruir uma massa a dizer que a homossexualidade é doença!!!

Porra! Se formos ver bem, doentes seriam os heterossexuais. Pelo menos até hoje ainda não tive conhecimento de uma violação “homossexual”, possivelmente temendo o estigma, tal como muitas mulheres não participam quando são violadas, os homens muito menos o fazem. Alguém pode objectar dizendo que nas prisões ocorrem violações homossexuais, mas eu diria não, pois os que violam os outros na prisão são heterossexuais. E sabemos bem dos tipos de psicoses que espaços fechados como prisões podem criar nos indivíduos.

pelo menos tem a sua piada
Eu fui criado heterossexual, e confesso ter também alguns preconceitos em relação a homossexuais, preconceitos estes cada vez mais minimalizados... mas todos dizem que cada um manda no seu rabo, cada um tem o direito de fazer o que quer com ele (alusão a homo-homens), então por que tanta algaraviada pelo rabo alheio? 

E se se estranha a alguém como é que um homem pode gostar de sexo anal (estou a tentar usar uma linguagem menos chunga) ou de beijar outro homem, pode simplesmente pensar como é que as mulher gostam de sexo anal e de beijar-nos. Se elas adoram quando nos beijam, porque não poderia um outro homem adorar quando beija um igual? Se elas gostam do sexo anal, porque não gostaria um homem? Nós somos moldados pela nossa educação e ficamos presos a isso, mas lá porque outras pessoas comem diferente de nós não significa que sejam doentes e nem que devem ser maltratadas (em todas as acepções da palavra e em todas as outras que ela pode obter)… revisem a questão na vossa cabeça.

23 de junho de 2009

UMA QUESTÃO DE... IGUALDADE

Esta reflexão deriva de um trabalho sociológico que por acaso tínhamos que fazer na faculdade. Pensei que talvez pudesse partilhá-la aqui, e é o que estou a fazer, não está o texto, acho eu, no estilo que costumo usar, está limpo, sem palavrões e tal, por causa do meio para o qual foi feito, entretanto não há crise algum. Alguma ingenuidade, mas... isso é normal.
Vai ele:


Todos somos alguém, sim. Concordo com a afirmação, mas, infelizmente, aplica-se na nossa sociedade a máxima dos porcos de George Orwell: todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros. Infelizmente, as estruturas sociais são o factor número um da segregação, e enquanto impera a dialéctica marxista teremos sempre a sociedade dividida em dois grupos, os senhores e os assalariados, e as reformas sociais só passariam pela substituição desses grupos por modelos novos, mas no fundo iguais aos anteriores (porque não ouviram Marx?).

Os bairros sociais, ou os guetos, são, geralmente, estigmatizados de violentos, inseguros e corruptores, e, portanto, os seus habitantes são olhados com desconfiança e preconceito, pelo que de uma maneira ou doutra organizam-se contra as esferas exteriores, e se são realmente violentos, são-no por oposição ao governo ou sistemas que consideram o gerador dos seus problemas e também aos estranhos aos seus meios, pois tal como são preconceituosamente apodados de violentos, da mesma forma apodam os que não pertencem ao seu meio de inimigo, permita-nos a palavra.

Por exemplo, numa carta de leitor publicado no jornal Destak (cujo número não me lembro), um senhor, em reacção a uma peça de noticiário da televisão, onde uma das moradoras do Bairro de Bela Vista reclamava contra o uso da força dos polícias, defendia que não se deve dar voz aos marginais porque os problemas da sociedade (suponho que a portuguesa) são criados por eles.

E daqui pode-se perguntar: sofrendo de segregação e ataque deste género e tendo à minha disposição apenas a violência para me defender, podem-me culpar quando tento sobreviver num meio para mim hostil?

Não pretendo fazer aqui uma apologia da violência ou a apoteose dos marginalizados dos bairros sociais, mas tal como disse Mônica Frechaut neste artigo a analisar: Estas pessoas esforçam-se diariamente por uma vida melhor e não necessitam da tolerância dos outros, mas sim da garantia dos seus direitos.

A palavra que mais salta à vista neste conjunto é a tolerância. Superficialmente, a tolerância seria o factor fundamental para a inserção social dos habitantes dos bairros sociais, mas a bem ver, percebe-se que tolerância não significa necessariamente respeito ou aceitação, mas sim obrigação de aceitar alguém por perto, pelo que pode ser negativo falar de tolerância em vez de respeito e aceitação, por outro lado se nem mesmo a tolerância funciona, mais difícil é os outros funcionarem.

E os direitos? Como podem ser garantidos direitos a pessoas a quem até mesmo a tolerância é negada? Quem seria o garante desses direitos? O governo? Em princípio, sim.

Mas se os próprios governos, após anos de logro com os programas de habitação sociais, e mesmo percebendo que esse método de segregação não é benéfico para a estabilidade social, pelo menos no que se refere à segurança, entre outros, ainda continuam a praticar esses programas, criando gaiolas de contenção em nome de habitação, e muros de campos de concentração que chamam de limites do bairro, então podemos dizer que o governo não está interessado em garantir o direito aos marginais dos bairros sociais, mas simplesmente a concentrá-los numa mesma zona, onde de vez em quando pode mandar polícias para arrebanhá-los e controlá-los. Só que parece não pensar que a saturação desses problemas no exíguo espaço que constitui o bairro faz com que estes se alastrem para os outros bairros e outras camadas que querem manter protegidos.

E com isso posso dizer que sei onde está o problema e que o governo é o culpado? É claro que não. Principalmente, porque quando se fala de direitos fala-se também de deveres? Ninguém se referiu aos deveres das comunidades de bairros sociais, neste caso, do Bairro de Bela Vista. E, considerando que, mesmo as pessoas com as mais básicas noções da justiça ou dotados de algum senso comum percebem que a inclusão social passa pelo respeito das fronteiras individuais – como sabiamente diz o povo: onde acabam os teus limites começam os meus! – e não atentar contra o bem estar do outros, então não é lícito de forma alguma que alguém violente outrem (com assalto, verbalmente, ou mesmo, e principalmente, através de leis aprovadas no parlamento); da mesma forma que condeno o acto dos dois vitimados, que, aliás, não foram os únicos, assim também condeno a reacção que tiveram os polícias. E por outro lado, levantando ainda a questão de direitos, eu diria que toda a gente tem o direito de ter o estômago cheio, e talvez eu não condenasse uma pessoa que roube para comer, desde que não ponha em risco a integridade de outrem. Mas no caso Bela Vista, ninguém falou dos motivos dos dois malogrados terem efectuado o assalto – foram vítima da fome, ou foram mais um dos muitos iludidos pelas publicidades televisivas que mostram produtos efémeros como fundamentalmente necessários à vida e que ditam a moda (não se está a  tentar aqui transferir a culpa), ou apenas queriam satisfazer outras espécies de vício?

É difícil fazer um julgamento justo quando não se pode resumir tudo em preto e branco. Entretanto sempre pode-se perguntar: por que razão em bairros ricos, como Cascais, não se faz rusgas, quando até mesmo jornais dizem que se realizam festas onde o consumo de droga é abundante e parece ser regra? Por que não permite a autoridade que se violente a casa dessas pessoas, que ponham às avessas a sua privacidade, que vão para lá canais de televisão filmar as suas caras e mostrá-los como os degradadores dos costumes morais e sociais? Certamente é por serem mais iguais que os outros.

Queiramos ou não, acabamos por atribuir ao governo a maior quota de culpa desta equação, porque em nome de uma lei igual usa pesos diferentes e medidas diferentes beneficiando a uns e penalizando a outros.

É preciso quebrar o ciclo de pobreza, apontar na formação e diminuir a precabilidade liberal (seja lá o que isto quer dizer) e o desemprego, ao invés de demonizar, ainda mais, o bairro. Palavras de Mónica Frechaut.

A realidade é que os governos parecem subsistir da pobreza, e quebrar esse ciclo seria passar por uma reforma completamente utópica e irreal, aliás, nem mesmo Marx, com as suas ideias de equilíbrio, o conseguiu. Além de que, como diz C. K. Chesterton n’ O Homem Que Era Quinta-Feira, o povo não se revolta, a revolta faz-se lá cima (pela burguesia). Portanto, enquanto os ricos não estiverem dispostos a abrir a mão dos seus benesses o ciclo de pobreza dificilmente será quebrado; e como os governos dependem totalmente da economia, e a economia é controlada pelos ricos, teremos sempre o episódio do bairro de Bela Vista a repetir-se.

8 de junho de 2009

PENSAMENTOS INEXACTOS - CAP. IV


HIPÓCRITAS OU BONS SAMARITANOS

A forma de pensar do Séc. XX é muito pesado e obscuro, mesmo para os praticantes de magia negra (bem, considerem isto como uma tentativa de fazer piada).

Mas a verdade é que quando ninguém confia em ninguém e quando é isso que toda a gente aconselha a toda a gente: não confies em ninguém… mas em mim podes (claro, em mim, porque eu só faço parte do mundo, mas sou diferente, não sou como os restantes), então vemos como as coisas não andam bem por aqui e como a hipocrisia é tão grande quão absurda.

Os hipócritas, como não há continente onde caibam, espalharam-se pelo mundo inteiro e são mais numerosos que os restantes homens, e portanto, passaram eles a ser normais. (Usei o pronome eles não porque me considero fora do grupo, mas porque quero acreditar-me fora). A sociedade está poluída de hipocrisia e a melhor forma de disfarçar é repetir sabiamente na estupidez: faz o que digo e não o que faço. É assim que se pretende dar uma orientação?

Li livros e relatos escritos desde séculos antes de Cristo, a Bíblia Sagrada, Epopeia de Gilgamés, Odisseia, Eneidas, passando pelos séculos mais recentes até ao nosso, e de facto o que percebi é que o homem só foi mudando de vestimentas e de materiais, acessórios, mas que a essência permanece igual. Entretanto, não deixa de ser relevante como até há uns séculos antes cavalheiros davam a sua palavra e mantinham-na, não deixa de ser tocante (absurdo e estúpido, é certo, para mim que tenho a mente lavrada pelo Séc. XX) Egas Mozin ter enfeitado o seu pescoço com uma corda levando a si e a família para o rei da Castela dispor da sua vida. Existiam homens de palavras e a palavra valia ouro, mas hoje, sem assinatura num papel, testemunhas, advogados e, no melhor dos casos, apenas peritos em caligrafia.

A anomalia que nos habita a mente e faz-nos o que somos foi gerada por milhões de hipócritas que passaram por este planeta antes de nós, e como nós não rejeitamos o errado, apenas o aperfeiçoamos para parecer menos errado e dispomos dele para o nosso fim, possivelmente não há em todo o universo ser algum que se bate connosco em termos de malícia e malvadez de espírito… se até mesmo a Deus conseguimos levar à palma.

Por exemplo, imaginemos um Bom Samaritano do Séc. XX.

Estava um judeu espancado, à beira da morte e, à beira da estrada. Passava por ali um palestino (vamos actualizar os factos), ao ver um homem no chão estirado e imóvel, desceu da sua carripana e aproximou-se para ver se os bandidos não tinham deixado nada que se aproveitasse. Porém, ao chegar perto reconheceu que tinha ali um judeu, povo que desde a Bíblia humilhava o seu e que agora está constantemente a criar-lhe problemas por causa da Faixa de Gaza, então enalteceu-se, o seu coração rejubilou de alegria (se não for redundante), iria ajudar um homem que sempre o desprezou, ia fazer com que ele nunca voltasse a desprezar ninguém. A cena até evocava uma criança judia a ajudar Hitler, já todo velhinho, a atravessar a estrada. Oh! Que comovente! Então, o nosso palestino volta para a sua carripana e… vrrrrum!… protch!... espalma com a roda a cabeça do judeu.

Conclusão: os samaritanos de hoje não são nada bons, mete-se com um e está-se tramado. E quem é o culpado? 

A xenofobia, apesar de diferente maneira, marca qualquer homem. O estranho sempre é visto como um ídolo, uma divindade, um demónio ou uma merda. No entanto, as sociedades, mais complexas, dão hoje mais oportunidades para de curar desse mal, mas infelizmente temos muitos séculos de segregação por cima que deixam sementes no inconsciente e que despoleta de quando em quando, variando ocasiões, o nosso senso xenófobo. 

Mas, voltando à questão inicial, quando nos fala um samaritano de hoje, rasgamos o peito para lhe entregar o coração. Temo-lhos vários, encabeçando governos, encabeçando congregações religiosas, encabeçando seitas, escrevendo livros e dando palestras que prometem mundos e fundos, temo-lhos a habitar o mesmo bairro, o nosso vizinho de lado, temo-lhos debaixo do mesmo tecto – quando temos um tecto – e temo-lhos na mesma barraca, ou a partilhar o nosso caixote… e… somo-lhos. Somos hipócritas, com medo da palavra, mas bons samaritanos.

Mas será por isso que o mundo pára? Ou que devemos nós parar se o mundo não o faz por nossa causa?

1 de junho de 2009

QUE NOS MOSTRA O DAVID?

Hoje este post vai ser meio diferente, pois falo da televisão e da música, o mote é o programa da TVI, aquele com putos, não me lembro agora do título e estou com preguiça de ir ao Google.

A razão porque falo disso, refere-se simplesmente ao personagem vencedor David Qualquer-Coisa.

Em primeira mão vou começar por dizer que não costumo ver o programa, e só costumava ver uma pessoa quando era ela a cantar, Ana Qualquer-coisa Cordeiro, uma miúda que domina o palco e tem um à-vontade estupendíssima e muita presença a apresentar e a cantar, sem contar com a forma como manda na sua voz. A bem dizer, aquele batalhão de putos sabiam cantar, mas eu só gostava de ver essa.

Ontem por acaso vi o David e mais alguns outros. O David não é um fenómeno, pelo menos acho que não, mas bem que podia ser considerado e vou-o fazer.

O que nos pode mostrar o David? Quando ele é entrevistado pelos apresentadores revela-se de uma timidez aguda, que até chegava à afonia, e também de uma atonia tal que parece não estar muito nervoso ou estar super-nervoso, a sua linguagem corporal na altura em que fala com os apresentadores revela muito menos do que os restantes, que agarravam fortemente na microfone, coçavam os braços, acariciavam-se ou demoravam a perceber a pergunta, mas sua forma de responder demonstrava que se sentia também inseguro, mas quando começava a cantar, David era outra pessoa. E simplesmente respondia à pergunta que muitas vezes se fez durante o programa: os putos melhoram por terem participado no concurso? Claro que sim, sentiram reconhecidos os seus talentos, sentiram-se mais confiante e mais em si, porque têm os seus quinze minutos, e de uma forma ou doutra, estão entre esse punhado idolatrado que aparece na TV, ou seja, aumentou a sua auto-estima e todos sabemos como isso é importante para um homem ser bem-sucedido.

O que nos mostra o David? Quando se enganou durante a música e esqueceu as letras, o público foi solidário e tentou ajudá-lo e os apresentadores e os júris também foram, e essa solidariedade passou para o público telespectador, e ainda se aproveitou para culpar a imprensa desse desquite. Eu sei lá se foi a imprensa ou os próprios pais de David ou o próprio David preocupado em ganhar o culpado. Mas o que demonstra é que o seu talento foi reconhecido porque o público apercebeu-se que o facto de um lapso de memória temporário não pesa no seu talento.

A transformação de David no palco emocionou-me, principalmente porque eu sou como ele, tímido até ter audiência, e sua voz convenceu-me, mas artista dos artistas naquele meio era a tal Ana Cordeiro.

O que nos mostra o David (bem, esta é simplesmente uma suposição, mas não infundada apesar de tudo) o quando o racismo funciona. David ganhou entre oito candidatos se não estou em erro, com uma percentagem de 38, por outras palavras, uma maioria esmagadora. Se em parte contou a simpatia do público por ele se ter equivocado algures no meio da canção, por outra parte, e acho que a mais significante, foi o facto de ter sido o único preto no programa, pelo que a solidariedade de todos os pretos votantes (espero não estar a exagerar) foi para ele. Ou será que isso não é racismo?



PENSAMENTOS INEXACTOS - CAP. III


NA DANÇA DOS LOUCOS


No entanto, pergunto a mim mesmo: quem são os que afinal estão na razão? São os que apodam os outros de louco? Ou os que aceitam o apodo? Enfim, se formos ver bem, o homem geralmente oferece o que precisa para o poder receber depois. Entretanto, na sua totalidade, os homem podem ser assim classificados:

– loucos que se julgam loucos e são loucos.

– loucos que se julgam sãos e são loucos.

– sãos que se julgam loucos e não os são.

e a categoria especial:

– loucos que se julgam loucos e não os são.

Do último grupo prefiro distância, dos três primeiro, não sei dizer qual é o melhor. Mas homens, como sempre os conheci loucos, não sei se tinha nervos para aturar algum são, realmente são, e que, para o cúmulo se julga são.
Ninguém é perfeito, diz o cliché, mas ninguém gosta de se dizer imperfeito ou mesmo de se sentir imperfeito – a não ser, é claro, quando comete um erro crasso e não tem ninguém em quem jogar a culpa. E atitude destas é loucura ou sabedoria?

Também eu pensava que Hitler era louco, até tentei ler o Mein Kampf para ver se tinha laivos de filosofia e inteligência como Voltaire ou Erasmus, e, por acaso, em muitas páginas, tinha, mas não consegui ler a obra toda, porque ainda dentro dela me convenci de que não era Hitler o verdadeiro louco, mas aqueles que o liam, ouviam e viam nele uma espécie de Messias com uma missão divina e glorificadora, antes porque o livro tinha pataratas imensas.

O que é certo porém é que na dança de loucos mesmo que seja a sapiência a marcar o compasso dança-se à loucura.

Por que será que os animais não enlouquecem? Ou enlouquecem? Ouvi falar de vacas loucas, mas não percebi qual foi o padrão usado pelo psicólogo que assim as classificou. Um vez uma vara ficou louca e atirou-se ao mar, disseram que fora possessa por uma legião de demónios a mando de Cristo – que crueldade!, estivesse ali a sociedade protectora de animais ou algo no género, o gajo ver-se-ia numa camisa de onze varas. Percebe-se que essa vara tenha ficado mesmo louca, porque por (e em) princípio porcos não nadam, chafurdam na lama, e nem saltam de precipícios simplesmente porque não saltam. Que os terá feito saltar então? A consciência, supostamente. Quando os demónios lhes entraram no cérebro ou na alma, ganharam a consciência, e ao sentirem o peso dessa consciência, sentiram-se antinaturais, e resolveram saltar, optando pelo suicídio. Porém, como a ciência não acredita em demónios, o que fez que as vacas tenham ficado loucas? Será que é porque lhes põem a ouvir Mozart para estimular a produção de leite? Será que é porque em vez de as deixarem escolher o seu touro escolhem por ela um touro? Será que é porque em vez de ela dar a mamar naturalmente – obtendo o prazer freudiano (?) desse facto – põem-lhe nas tetas mamadeiras? Alguém de certeza sabe.

Se até as vacas, descerebradas segundo se diz, conseguimos deixar loucas, imaginem o que não fazemos aos nossos semelhantes! Algures num ponto da pré-história o homem ficou louco, se calhar foi mesmo quando despertou a sua consciência, ou foi quando Adão comeu a Eva, desculpem, a maçã, e o resto foi simplesmente transmissão de vírus através de diversos factores como a educação e a socialização.

Não simplificamos nada, em vez disso conotamos a simplicidade à pobreza, pobreza criativa, pobreza de espírito ou pobreza de qualquer outro tipo. Quanto mais complicados, mais gostamos. Deus deu duas tábuas de dez leis a Moisés – embora Mel Brooks tenha dito que foram três tábuas de quinze –, apenas dez, mas depois resolveu meter mais regras a observar. Hamurabi tinha outras tantas leis para cumprir, e a sua sociedade, pode-se dizer, vivia equilibrada, hoje temos milhentas vezes mais leis do que Hamurabi, mas a nossa sociedade é a mais complicada e desequilibrada. Ora digam lá se isso não é loucura. Por quê muito para complicar quando poucas podiam resolver tudo? Será que porque pouco não parece ser grandioso?

A grandiosidade é o nosso maior problema. É por sua causa que os homens se dividem e estabelecem classificações. Grupos julgando-se melhores que grupos, sistemas e subsistemas de aproximação e afastamento, indivíduos, famílias, classes, castas, clãs, tribos, etnias, raça, nacionalidade, cor, continentalidade, crença e só por fim a humanidade. E partindo do círculo menor, o indivíduo até chegar a humanidade, as igualdades reduzem-se abismalmente de tal forma que a humanidade parece não existir, embora esteja em voga agora o conceito globalização.

Quando começou tudo? Vai mesmo acabar neste século XX? Enquanto isso deve-se agir em conformidade ou à rebeldia? Loucos são os que remam contra a maré – loucos, loucos e loucos –, mas loucos também são o que se deixam arrastar sem contestar – loucos, sãos, mas loucos.

Qual é saída a escolher neste nosso tempo?

25 de maio de 2009

PENSAMENTOS INEXACTOS - CAP. II


O SENSO DE JULGAR

Não julguem para não serem julgados, disse uma vez o mais sábio homem que alguma vez reportou a história, depois de Leonardo da Vinci.

Que validade tem as opiniões humanas sobre assuntos alheios? Que validade tinha a opinião dos missionários quando acharam que os africanos só seriam salvos se abandonassem os seus cultos para abraçarem os deles?

Todos pretendem ter a capacidade de julgar, todos se sentem com o senso da justiça – coisa que não existe – mas ninguém nota que sabe julgar tão bem como sabe voar.

O homem criou a justiça para poder julgar injustamente em tranquilidade. A constituição, os direitos humanos, a Convenção de Genebra, só servem no papel e, provavelmente daqui a uns bons pares de anos, serão usados como contos para adormecer crianças. Hamurabi já tinha tentado legislar, mas isso não evitou guerras e injustiças, os judeus idem, mas o mal não mudou de aspecto, Péricles, Platão, Aristóteles, muitos mais tentaram. Ainda há quem acredite na justiça?

Os homens com dedo na testa sabem que a justiça é uma fantasia sem a qual os homens sem dedo na testa – incluindo os mutilados – não conseguem viver. Hoje não há, quer dizer, há sim, mas em minoria, homens que crêem na justiça, mas, apesar disso, continuam a pedi-la. Quem entende o homem?

Os advogados, os juízes, os juristas, e toda essa cambada, só defendem o salário e a comissão, não se preocupam em estabelecer a justiça, mas ganhar as causas, e se não defendem os pobres, usando pesos e medidas diferenciadas, é porque ganha-se mais a não condenar ou a não deixar serem condenados os ricos. Se mesmo os grevistas pobres furam greves porque se sentem mais a ganhar com os patrões estando do lado deles do que apoiando os colegas que lutam por um salário mais justo para eles, inclusive, não se vai perceber o acto dos supostos defensores da justiça? Não confundir perceber com compreender.

Quando um político discursa gaba a implacabilidade do governo a fazer justiça, implacabilidade que não garante a imparcialidade, mas granjeia assim confiança, confiança que traz dinheiro, dinheiro que traz injustiça, injustiça que pede pela Justiça, pedido que cria sistemas, sistemas que geram políticos, políticos que falam de Justiça, Justiça que não existe.

Justiça! Bela patarata! A justiça, a que temos a disfarçar-se da verdadeira, é uma ladra, rouba a privacidade, rouba a individualidade, cega a Razão. Desde tempos imemoráveis que se fala dessa fantoche. Dizem até que é cega, ou, que tem olhos vendados, e que anda com uma balança na mão esquerda, para pesar os actos humanos, e uma espada na direita para os castigar. Cega!, nem admiro que a pesagem nunca esteja certa.

A figura que mais se ajusta à justiça é como desenhou um cartonista: uma velha cansada com uma balança a qual falta um prato, uma espada enferrujada e a venda levantada de um dos olhos. Ela, em todo o caso, se fosse verdadeira, está já reformada, se em tempos idos os homens agiam conforme a sua vontade, hoje é ela que se submete à vontade do homem, o homem do poder; primeiro, senhora, agora, escrava.

A justiça é um defeito com que o homem vive; criou-a há incontáveis eras e tanto a ela se acostumou que já pode viver com a sua ausência. Mas, mesmo na definição tosca da actual justiça, o que é ela?

Um juiz que condena o próprio filho é mais justo do que aquele que iliba o seu mesmo o sabendo culpado?

O juiz que condena um filho, se calhar é ético, mas é um insano, pelo menos para mim, porque mal por pior venha o menor. E sei que quem ama é insano, portanto, com um silogismo sofístico podíamos concluir que um juiz que condena o filho fá-lo porque o ama, e logo é justo, ou seja, quem ama é justo. Logo, a justiça encontra-se no amor. Mas, para derrubar o próprio raciocínio, simplesmente temos que pensar que maior insano é quem ama o que não existe, e logo se a justiça não existe o juiz não pode ser justo e não sendo justo, não ama o filho e nem podemos conectar ao amor a justiça.

Ou vejamos esta outra ilustração: um pai que sabe que o filho será a sua desgraça e mata-o para enganar o destino é mais injusto (ou louco) do que aquele que ajuda o seu para que este venha a matá-lo? Laio era cruel quando queria desfazer-se de Édipo? Ou era louco Príamo por ter condenado o bebé Paris? E Hitler… era louco?

Julgue quem saiba, eu copio o Pilatos.


18 de maio de 2009

PENSAMENTOS INEXACTOS


Por exemplo, quem sabe se Homero, quando escrevia Ilíada e Odisseia, acreditava que escrevia verdades sob a direcção de uma inspiração divina, como os autores da Bíblia, ou então que escrevia apenas um romance, quando Hesíodo afirmava que também as musas mentem? Quem sabe se foram os homens que depois acharam que Homero escrevera verdades? Ou as verdadeiras verdades por ele escritas é que depois foram mitificadas? Homero escreveu do seu cérebro ou transpôs para o papel o que os outros diziam?


A razão ou a emoção? A cabeça ou o coração? Devemos aceitar fervorosamente todas as verdades porque há como prova quase uma população mundial que as aceita, ou devemos pensar nelas e rejeitá-las se assim dever ser?, eis a questão.




SOMOS LIVRES OU PRISIONEIROS
A sociedade concede o desejo de ser especial, e somos simples seres seduzidos pelo sucesso social, e sem sequer sabermos forçosos somos sugados, para os sebosos centros devassos, de viscosos sonhos escassos, e vistosos saberes esparsos e conceitos sujos de sermos os sujeitos cujos preceitos serão o centro desta sociedade selvagem.
Conceituosamente, a essência de saber ser um ser saudável sempre será a séria preocupação assente no nosso senso. Tenso, penso que simplesmente é difícil ser o ser social que o nosso cérebro sempre sonha, e saber sentir o sabor que suaviza a seriedade de sermos servos submissos de sádicos conceitos sociais, de segregações raciais, de seleções faciais, separações em espécies físicas: em secos e obesos e altos e baixos, e fortes e fracos e formosos e feios e fiéis e falsos e fixe e fakes… mas no fundo fomos fodidos.
Separamo-nos em espécies, classificadas em sortes diversas, e sempre ansiosos singramos na diferença, e suspeitamos da semelhança. E somos assim separados do saber que concede na existência o sabor da saúde cerebral, independência e sossego social.
E eu sempre indeciso sobre o que é preciso, sabendo que o nosso consórcio solicita muito siso e pouco riso, e eu não friso a causa disso. Eu penso que se deve ser o que se é, não o que sociedade quer que se seja. Eu seria o que sou, não o que penso que eu sou, nem o que querem que seja, mas saberia separar as superfícies e balizas, e conhecer quais as minhas, e quais são proibidas, pois o sarilho com estrilho sempre surge quando se turge a circunscrição. quem são? Quem somos? Quem és? Quem sou?
Sou eu um ser feito, sou um ser perfeito, sim, eu sou perfeito… perfeitamente imperfeito! Sou feito de defeitos, de preceitos, de conceitos que enfeito a jeito de respeito em proveitos escorreitos, pois o leito do meu peito é atreito a preconceitos, que rejeito ou aceito, criados por mim, dados a mim, guardados aqui, compostos e dispostos em postos e repostos e proposto como supostos impostos, e aposto que é o que põe este gosto tosto no meu rosto. Serei um monstro?
Há em mim séries de assonâncias, de consonâncias, de dissonâncias, de ressonâncias, muitas ânsias, e sem fragrâncias, essa dança já me cansa. Com esperança na mudança, sem confiança, de forma mansa nesta balança, o querer ser avança, mas não se entrança nem alcança o que o ser é.
Mas é preciso fugir de pontas, descer, subir, ficar no meio, meditar, pois o mundo está mal, preparar novas formas de viver, computar o mal das sociedades, reparar o ideais entortados, separar o essencial dos acessórios, amparar AS vontades de utopias – quando promovem diferenças – disparar sonhos contra o mal, decidir com escolhas altruístas para presidir a uma boa vida para todos.
A vida reside no espectro. O que é o mundo senão um ícone de sombras? São só sombras que trespassam o nosso sonho e dá-nos a impressão de termos escapado da caverna de Platão.
Eu sei que muitos não me vão entender e vão querer julgar-me.

15 de maio de 2009

INTRODUÇÃO À PSEUDOFILOSOFIA DE PENSAMENTOS INEXACTOS


Li Erasmus tinha praí 16 ou 17 anos, impressionou-me sobremaneira, e posso até dizer que mudou a minha forma de ver as coisas. Nessa mesma época li Voltaire, começando por Cândido, e passando por inúmeros contos. 

Erasmus escreveu Elogio da Loucura, Voltaire, Elogio da Razão, eu pensava que os dois iam entrar em choque, e como Voltaire era muito por mim respeitado, gostava mesmo que me desse um outro ponto de vista, mas não é que um e outro, falando de coisas antagónicas, estavam em sintonia. É certo que Voltaire é posterior a Erasmus.

Ainda, nessa mesma época, continuando a minha busca por um ponto de vista antitético, e fascinado, confesso, por filósofos, filosofias e filosofices, fui parar ao Pensamentos de Pascal. Foi o cúmulo, tinham-me trabalhado bem a cabeça esses três, sem contar com outros que andava a ler nessa altura, e que depois vou identificar a medida que vou fazendo este blog.

O bulício mental que processava nos meus pobres miolos resolveu-se à caneta e papel, e vou aqui passar esses pensamentos. 

Quem já leu Erasmus vai perceber a sua influência na linha como apresentei estes pensamentos... também tenho Pitigrilli aos montes. E... mais, nessa altura, estava a ler um livro chamado Questão Coimbrã, pelo que em muitas partes senti muita vontade de escrever em rimas... e fi-lo, com bons e maus resultados.

O mais engraçado, para mim, pelo menos, é que descobri os textos que vou depois apresentar entre os meus montes de papéis, e ao relê-los, vi que apesar de serem ideias nascidas ou postas por autores diversos na mente de um puto, a minha forma de pensar não mudou assim muito, larguei umas certezas, aprendi outras, mas a maior diferença é: onde antes eu tinha ingenuidade hoje tenho... se calhar, cinismo.

Vou terminar aqui este post, começando por apresentar as reflexões do rapaz que eu era no próximo... só vos peço, não batam muito no ceguinho.

RAPIDINHAS

Vi Obama na televisão esta semana a confessar-se perante o povo, pelo menos a parte não besta e facilmente levada. O que ele fez foi simplismente afastar os papéis (que significa que alguém os escreveu para ele) e proferiu qualquer coisa como: vou-vos falar hoje sinceramente e de coração (significando que toda a camapanha e tudo o resto eram só balelas)... mas nós sabemos que esse suposto discurso de coração já tinha sido ensaiado antes... ou não sabemos?

Nas páginas de Destak, na rubrica carta de leitores, apareceu um tipo a dizer, referindo-se ao incidente de violência no bairro da Bela Vista que começou com um assalto e resultou na morte de um desgraçado abatido pela polícia, que a irmã ou vizinha deste não devia ter voz, que não se deve dar voz aos marginais... eu pergunto, e aos acéfalo?

5 de março de 2009

É O INCESTO CRIME?


Há algum tempo li sobre dois irmãos alemães que tiveram quatro filhos, não me chocou, amavam-se. Entretanto, recentemente encontrei-me oura vez com a mesma notícia e fonte diferente a dizer que o irmão tinha sido condenado à prisão por essa razão, isto sim, chocou-me. Eu sei que vai parecer bem desactualizado falar disso só agora, visto que se passaram dois anos sobre o assunto, entretanto, nunca é tarde para questionar: por quê?

Pessoas do mesmo sangue não podiam ter filhos, o povo é inteligente, o conhecimento empírico nem sempre falha, porque nasciam com malformações e outros problemas; atribuiu-se à causa, não a sangue, mas a deus, castigando os consanguíneos que se uniram.

Agora, séculos depois de os primeiros macacos terem estabelecido esse tabu estranha-se que, apesar dos conhecimentos científicos que hoje temos, ainda continua a imperar e, como se não bastasse, como um crime.

Por que não podem se amar maritalmente dois irmãos? Porque vai contra o senso comum, apenas por isso. Porque as pessoas não estando habituadas a verem tal coisa, levantam-se logo para gritarem contra, como se isso tivesse a ver directamente com eles.

Eu conheço casos de incesto, conviviv já com duas pessoas que se diz serem resultado de um incesto pai-filha, convivi com outra família cujas más línguas diziam que o chefe dela era incestuoso, pondo-se o avô nas netas. Odiei tomar o conhecimento deste segundo caso, porque estava apaixonado por uma das netas e ela só tinha 13 anos (eu tinha já 16), isso constitiu um abuso e sou contra.

Entretanto, se houver consentimento mútuo entre pai e filha, irmão e irmã, mãe e filho, por que não podem ter relações sexuais e viverem como um casal normal? Jocasta viveu com Édipo e foram felizes até o Sófocles decidir que já não deviam mais ser. Enquanto não sabiam da verdade, nada os impedia de ser feliz, a sua relação não chocava a ninguém, tiveram filhos e viveram bem, mas quando se soube da verdade, a opinião de todo o mundo mudou. Mas fica a pergunta, algum deles deixou de ser o que era? Jocasta deixou de ser Jocasta? Édipo deixou de ser Édipo? Não, tinha que acabar em tragédia para agradar ao senso comum, mas na verdade, podiam continuar a viver bem.

Os animais não pensam no incesto, simplesmente praticam-no e nem o chamamos de incesto, por que nós já temos de condenar os que decidem por esse modelo? 

Dois irmão gostam um do outro, tal e qual como toda a gente, têm direito de obter o objecto do seu desejo. Mas não, não podem, porque nós condenamos, qual temos alguma coisa a ver com a decisão deles, qual a sua escolha nos vai afectar.

Ensinados pelo Freud a reprimir instintos incestuosos, Freud pelo povo, percebe-se muito bem que ele existe e que tanto pode ser casual como não.

Lembro-me de ler algures a entrevista de um pai de uma dessas muitas estrelas que vai posar nua para o playboy dizer que está orgulhoso e que sempre comprou a revista e que sabe que a filha é um belo pedaço. Eu perguntei-me será que ele vai bater uma pela filha? Ou tipo, se fizerem a edição e substituírem a cara da filha ele não irá gostar de ver o corpo? Agora, se não lhe incomoda ver a filha nua nem deitar-se com ela, por que devia incomodar-nos a nós?

Vi um filme há já um bom par de anos, onde um homem entrou num encontro às cegas, tinham de lhe vendar os olhos, e foi dormir com a sua irmã, que também estava de olhos vendados, apaixonaram-se, e depois começaram a procurar a pessoas com quem estiveram e acabaram por descobrir a verdade. Pergunto agora, o que é que mudou da atracção que sentiram quando estiveram de olhos vendados, quando eram um para outro simplesmente homem e mulher, senão o facto de descobrirem que afinal eram irmãos que viviam na mesma casa e nesse caso a sociedade os condena? O filme só foi ao fundo do assunto à moda porno, pois era porno, ou seja, não o explorou devidamente.

Pá, sejamos mais flexíveis, deixem cada um fazer a sua escolha desde que essa escolha não magoe a ninguém, e nem sequer usemos a palavra devassidão para casos desses.