28 de julho de 2011

QUEDA, A - Albert Camus (1972) - viagem ao centro da alma


Um dos livros mais surpreendentes que já li (bem, por esta altura já devem estar enfastiado de ler aqui esta frase) foi A Queda, de Albert Camus, que já foi o Nobel da Literatura 1957, porque o livro parece ter sido escrito por mim. Peraí, não me entendam mal, não estou a reclamar o talento do autor, nem a comparar o génio, mas porque senti que o autor estava a analisar-me nessa obra.

A Queda, começando do fim, é um livro obrigatório e que ninguém nesta vida devia passar sem ler, é um livro necessário porque leva a uma auto-análise e parte dele parece uma versão alargada do Poema em Linha Recta de Álvaro de Campos. Eis a sinopse:

Um advogado, que costumava ser um indiferente, por um acaso qualquer, viu uma mulher a suicidar-se no rio Sena. Não tendo reagido para ajudar a mulher, preferindo esconder-se por isso não ser o seu problema, é perseguido depois pelo fantasma dela, a sua própria consciência. Resolve então mudar o ser e ganhar a redenção, mas é aí então que perde o controlo de si próprio, acreditando que existe uma melhor maneira de utilizar a vida, mas não sabendo qual é essa maneira.

Não acredito que exista algum ser humano que leia A Queda e não se identifique com o protagonista. Camus debruça-se sobre pequenos vícios, idiossincrasias e costumes das pessoas, extirpa-os e revela-os ao sol. Creio que esteve a fazer uma auto-análise, usando o advogado como uma imagem para não parecer autobiográfico, no entanto, ao mesmo tempo, a analisar o mundo todo, o que faz com uma maestria incrível, pois ainda faz com que esse nosso autoconhecimento seja divertido e vejamos como ridículos somos.

A Queda, por verificar o homem, consequentemente verifica o seu meio (não o físico, mas o social: o ideológico, o cultural e outros subjacentes) e, portanto, foca sobre diversos aspectos éticos: o homem consigo próprio, o homem com o outro e o homem e o outro com terceiros (a comunidade ou a sociedade) e, ou, os terceiros com o homem e o outros. É certo que o homem é um ser social, mas será realmente que o inferno são os outros (como disse Sartre)?, será que os outros é que nos corrompem? A Queda atribui a cada um de nós a tarefa de fazer o mundo um lugar melhor, pois somos todos culpados. Aliás numa passagem que quem já leu o Evangelho Segundo Jesus Cristo, de Saramago, de certeza se lembrará, ele disse que até Cristo não é inocente, visto que foi salvo de ser morto, enquanto centenas de criança morriam por sua causa. No entanto, como vamos fazer deste mundo o melhor? Receio que o protagonista não sabe explicar, mas sugere que devemos fazer uma auto-análise.

Camus manifesta n’A Queda uma pouca fé na humanidade? Eu sei lá, no entanto duvido. Como em todos os seus títulos que li, parece procurar pelo sentido da vida ou pela sua ausência, se n’O Estrangeiro o protagonista era um indiferente, n’A Peste um altruísta, aqui, n’A Queda, é um indeciso, no entanto em comum todos os protagonistas têm a mesma característica: introspecção.

A Queda é uma leitura profunda, que dá muito o que pensar, mas ao mesmo tempo, tal como só os grandes autores conseguem fazer, a queda é uma leitura divertida e aparentemente superficial, que provoca bons risos e se lê de uma assentada. Eu li A Queda em diferentes fases da minha vida, a primeira, talvez com 16 ou 17 anos, quando me veio a pancada por filósofos, e embora estivesse no começo da minha aprendizagem de ler dentro dos livros, gostei logo. Dos títulos de Camus é o meu preferido (por ser o que mais está ao meu alcance mental) e é o personagem com quem mais me identifico. 
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...