27 de junho de 2011

TER OU NÃO TER FILHOS; EIS A QUESTÃO


Existe uma terra onde as pessoas põem luto quando nasce uma criança e fazem festa quando morre alguém.

Esta é uma alusão casual que aparece no Baudolino, de Umberto Eco sem qualquer impacto no desenvolvimento da história, sendo apenas uma das gotas de um mar de referências a crendices do povo europeu da Idade Média, algumas das quais, de certo modo, perduram até hoje. Porém, o paralelo entre o nascimento e o luto fez-me reflectir, porque a bem ver parece que é o que temos hoje. Passo a explicar.

Não pretendo dizer que uma criança seja realmente um motivo de luto, mas parece que embora os pais beneficiem da alegria da paternidade, há sempre uma flor de luto a benvindar a chegada da criança, se não, o que explicaria a redução da taxa de natalidade na Europa?

No filme Idiocracia (sobre o qual postarei uma leitura um dia) apresentou-se o panorama actual da questão de nascimentos e, em jeito de ficção científica (não tão científica assim), uma das suas possíveis conclusões. Mostra como as pessoas inteligentes planeiam os filhos: primeiro pensam na carreira, depois na segurança do lar e até terem a criança enfastiam-se uma da outra, ou então descobrem que não podem tê-la, ou têm-na, só uma, e ela lhes morre. Resultado: o número de burros aumenta, porque esses não planeiam, só se limitam a fazer filhos, e o dos inteligentes decresce. Ok!, é certo que não é assim tão linear, na questão burrice, digo eu, porque inteligentes podem fazer burros, assim como burros podem fazer inteligentes, mas isso fica para outro fórum.

Na realidade, a Europa, ou o ocidente, não está projectado para ter filhos, o sistema é anti-família e canibal, as pessoas não são mais do que meros gados para o enriquecimento de uma determinada massa. As pessoas são tratadas como investimento económico, têm que render, têm que dar lucro, razão porque quando não o fazem são olhados de revés e tratados como párias sociais. Ter um filho é uma responsabilidade tremenda, porque um filho, quando muito, só dá lucro emocional, e tudo aqui gira em torno do sistema financeiro, onde a emoção praticamente tem o índice zero de importância. Não querem saber que amas os teus e que esses te dão todo o suporte que precisas para aguentar as pressões que te põem em cima, não, isso não interessa, o que interessa é que tu e os teus consumam, consumam e consumam, e para continuar a consumir, têm que se submeter às regras de escravidão de uma empresa qualquer que te vai chupar até ao tutano.


Os governos incentivam o nascimento das crianças, porque a população está a ficar envelhecida, mas será que pensam na questão de envelhecimento como uma ameaça à sobrevivência da humanidade ou como um baixar do lucro? Há aqueles que dão um prémio de uns quantos milhares de euros para aqueles que lhes põem nas estatísticas mais crianças, por exemplo, a Alemanha que estava a dar 25.000 euros por cabeça, o que no fundo, no fundo não passa de uma armadilha. Uma criança chega ao mundo e é começado a ser cobrada até o dia em que partir, ou seja os tais 25.000 euros ainda acabam antes de ele chegar aos sete anos. A creche do meu sobrinho, por exemplo, é mais cara que a propina da minha faculdade, mas eu faço parte de produção e ele não. Não era mais fácil e justo que a creche dele fosse grátis, visto que não pode pagar por ela?

A paternidade na europa é uma questão muito difícil, porque para viver, ou sobreviver, praí 95% das pessoas tem que se matar a trabalhar, não dispondo de tempo para os filhos que põem no mundo, o que se traduz no aumento da quantidade dos pais que julgam que comida, vestida e dormida é tudo o quanto necessitam de garantir aos filhos para serem bons pais, e o elo emocional é assim tão frágil que quando ficam velhos, os filhos preferem metê-los num lar a ter sua companhia.

Agora, voltando ao primeiro parágrafo, será assim tão estranho fazer luto quando nasce uma criança? Não vejo motivos para festa quando morre uma. Mas o ocidente não ajuda em nada na questão de procriação (não estou a falar do acto, que o isso é muito incentivado, não obstante as advertências), porque uma criança, como já dissera, não produz, porém, como têm a certeza de que ela vai crescer, ser formatada (para perpetuar o sistema) e tornar-se produtiva, apostam nela, mas já os idosos é que não têm essa sorte (vou falar disso num outro artigo), e quando um deles morre, chora-se, mas também com uma flor de alívio e de festa.

Estou a dizer para não terem filhos as pessoas que os queiram ter? Não, não estou. Ainda mais que há inúmeros factores envolvidos que ignorei atendo-me apenas ao sistema economicocêntrico (se me permitem o termo). Estou é a dizer que o sistema não está desenhado para ter filhos, ou pelo menos para ter uma família com todas as sete letras, e dificulta imenso essa tarefa, ou seja, precisa de ser trabalhado ou reformulado. O que me lembra a piada: se o mundo fosse bom, as crianças não nasciam chorando.
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