1 de janeiro de 2014

TEMPO SUSPENSO, Philip José Farmer (1985) - a diversidade do mesmo

Quando mais novo, o meu género favorito era a ficção científica, tanto no cinema como na literatura. Gostava (ainda gosto) dessa temática, das teorias de máquinas de tempo, viagens interdimensionais, extraterrestres e tal, no entanto, eu considerava mais o aspecto exterior da ficção científica do que o interior: os ensaios que os bons autores fazem sobre a humanidade. E quando comecei a dar mais atenção ao segundo aspecto, deixei de considerar qualquer coisa que tivesse uma nave espacial de ficção científica, embora lesse tudo com essa classificação. Quando comecei a ler Tempo Suspenso, não estava à espera de nada, apenas de uma leitura leve, e foi o que encontrei, uma leitura leve, porém, com profundidade.

Tempo Suspenso é uma excelente leitura de ficção e um excelente entretenimento literário. O livro arrebata logo nas primeiras páginas e continua, em crescendo, a intrigar mais e mais. O tema é sobre a desesperança na humanidade. Ambientando num futuro distópico, pelo menos para nós aqui, sente-se nele influências do 1984, de Orwell, e do Admirável Mundo Novo, de Huxley, no entanto consegue ser fresco e original, e não fosse o facto de focar-se mais no contexto de aventura, de certeza que era capaz de ombrear com esses em profundidade.

Tempo Suspenso acontece no terceiro milénio, a humanidade sobreviveu, mas sobrelotou o planeta. Então para resolver o problema, o governo, absolutista, resolveu dar a cada pessoa um dia da semana para viver, passando os restantes numa câmara de suspensão. As pessoas vivem num dia qualquer, terça ou domingo, e à meia-noite estão na sua câmara, esperando pela próxima semana. Essas segundas, contavam-se dia a dia, como se fossem dias normais, ou seja os segunda-feiristas, tinhas os seus sete dias da semana completo, e com a tecnologia da suspensão, envelheciam normalmente cumprindo o ciclo biológico. Ninguém parecia ter problema com viver um dia, sendo que vivia todos, mas quem vivesse em todos os dias era considerado criminoso, do pior tipo, um quebra-dias.

Quando se tem um governo totalitário, ou de qualquer tipo que seja, existe sempre a oposição, e é aqui que entra o nosso herói, que é um quebra-dias, um criminoso, quase terrorista, e que vive com sete identidades, um para cada dia, para não ser descoberto, mas que trabalha para a oposição. Este é o mote para o desenvolvimento do Tempo Suspenso, no entanto várias questões, psicológicas e sociais, surgem durante a ocorrência.

Tempo Suspenso tem um belo ritmo e, como já disse, aposta muito na aventura, entretanto, sempre tem tempo para analisar a sociedade através de diferentes prismas. Tal como O Admirável Mundo Novo, mostra que as pessoas são condicionadas de diferentes maneiras e que na realidade, somos mais carneiros do que os próprios, e ao mesmo tempo, questionamos se quando existe a ordem e todos nós somos e estamos basicamente satisfeitos, se é mesmo problemático que esta ordem seja do tipo totalitário.

Farmer é magnífico em desenhar sociedades e idiossincrasias, cada dia apresentado tem etiquetas próprias, maneirismos, linguagens e vícios, podendo-se no entanto ver que não importa o verniz, o homem é sempre homem. E não importa o governo ou a oposição, quando a ideia é de dominar e de regular… bem, resumindo: o poder corrompe.

Uma bela e agradável leitura.
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