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Há poucos dias, no comboio, um homem
guineense a falar com uma mulher dizia: “larguei o meu bode, que cada um segure
a sua cabra”. Eu pensei, um tanto chocado: “Bolas!, isto ainda se diz?”, mas
chocado mesmo fiquei quando a mulher respondeu positivamente àquela besteira.
Que os homens guineenses, com alguma idade, principalmente, sejam idiotas machistas
não me faz espécie, afinal viemos de uma cultura de poligamia onde a mulher costumava ser negociada como mercadoria, e ainda continua a ser (e eu nem sou contra a poligamia,
desde que a mulher possa também se casar com tantos quantos quiser). O maior problema
foi ouvir a mulher a defender essa posição, essa mulher que um dia, na conceção
do tal homem, já foi também cabra.
Esta mentalidade machista, essas frases idiotas, que aparecem nas músicas populares e tidas como engraçadas, justificam, perpetuam e
incentivam as violações que diariamente ocorrem, não só em Bissau, mas em toda
a parte do mundo.
Se uma violação acontecer
na rua, começa-se por querer saber se foi “de noite” (o que ela estava a fazer
na rua a essa hora? por que tinha de ir à discoteca? estava a pedi-la.), se ela
tinha vestido um “tchuna” ou “toma-nha-numur” (vestido dessa forma! estava a
pedi-la.), se ela tinha muitos namorados ou nenhum (já estava acostumada com a
coisa. estava a pedi-la.); se a violação acontecer no quarto de um rapaz (o que ela foi buscar no
quarto de rapaz? estava a pedi-la.).
A rapariga está sempre a pedir para ser
violada ou porque quando dança rebola demasiado ou porque é muito atrevidinha ou
porque é “catorzinha” (disso eu falo num outro artigo). Os homens… não, não pensamos, afinal o mundo gira à volta
do nosso pénis.
Cresci a ouvir histórias de rapazes que bicharam (de fazer bicha) uma rapariga, e eram contadas com os rapazes no lugar de heróis e contadas de tal maneira que eu também desejava estar nessa bicha, levou-me bastante tempo a perceber que eram nada mais que violações e não um jogo que "os meninos machos fazem".
Os rapazes são ensinados de que as
raparigas são umas fingidas, mesmo quando querem, dizem: “Não!”. Por isso, não ligam sequer para os "nãos". Algumas raparigas
também são ensinadas que têm de fingir e dizer “não”, mesmo quando querem, o
que por vezes atrapalha completamente a coisa. Assusta-me ouvir homens, ao
contar as suas conquistas, a dizer coisas como: “ah, agora que me fizeste despir
é que vais dizer ‘não’”, ou seja, uma vez que a rapariga manifeste algum
interesse nele, uma vez que ela entre no seu quarto, não há volta a dar, “ela tem
de rezar”.
Não, porque pensamos que os nossos desejos devem ser satisfeitos a todo o custo. Mas não sabem que existem óleos de todo o tipo e feitio, sabão, sabonete, ou pensam que a saliva é apenas para ajudar a engolir… cuspam na palma da mão, caramba.
E quando queremos não importa que ela diga não, mas... não é não! Temos de aprender a viver com isso. Quando ela diz “não”, é para ser levado a sério como um “não”.
Muitas vezes vamos a uma entrevista de emprego, tudo corre bem e no dia seguinte dizem-nos que encontraram candidato melhor ou que não éramos o que pretendiam, o que fazemos? forçamo-nos na empresa porque nos tinham entrevistado antes? Os políticos prometem-nos mundos e fundos e depois dizem "não" (aliás, nem dizem, só nos viram as costas). Mas se sabemos aceitar esses tipos de “não”, por que não o “não” de uma mulher?