NÃO, NÃO e NÃO! NÃO FOI ASSIM. VIOLÊNCIA NÃO É EDUCAÇÃO!
Já me cruzei com esta imagem (e outras similares) em vários lugares na internet, com pessoas a enaltecerem isto como boa educação. Mas olhemos atento
para a imagem e leiamos a violência que emana.
Violência não é educação, nunca foi e nunca será. Se violência fosse
educação, por causa daquilo que passamos na mão dos tugas teríamos sido dos
povos mais educados do mundo. Essa fala de que “apenas o sute endireita o
guineense” é mais uma daquelas estupidezes que repetimos sem sequer pensar.
O sute nunca endireitou ninguém, o sute nunca educou ninguém. O que o sute
faz é criar submissão e medo, não respeito, medo. O sute faz as pessoas
dobrarem-se ante o medo e não aceitarem erguidas a razão. E o sute é um dos
maiores problemas da nossa sociedade guineense, senão o maior.
Somos educados com mantampa. Mantampeados e tcherninhados por dá cá aquela
palha, desde crianças é-nos ensinada a “LEI DE KON”: o kon maior bate no kon
menor, e assim progressivamente. Mesmo entre os kons duvido que essa lei
funcione, mas nós não somos nenhuns macacos, somos humanos, com maior
capacidade de reflexão e de pensamento… bem, olhando para o estado do mundo,
tenho dúvidas sobre esta minha afirmação… ohhhhhhkay… temos alegadamente maior
capacidade de reflexão, portanto, já era mais que tempo para começarmos a
reformular determinados conceitos que claramente não funcionam.
A violência na qual somos educados, que na sua maior parte é gratuita e
desproporcional, não é nada mais do que a incapacidade dos nossos educadores
lidarem com a sua frustração. Pessoas mantampeiam crianças que estão a chorar,
ao mesmo tempo que dizem “para de chorar, para!, cala a boca!”, mas como elas
vão parar de chorar se estão a bater nelas? Já vi educadores a baterem em
crianças bem pequenas, porque não querem comer ou por outra razão qualquer e
julgam que estão a educar. Mas, vamulá, se mesmo a conversar com essas crianças
será difícil fazer-lhes entender o porquê de não fazer certas coisas, muito
menos elas irão entender o problema do que fizeram batendo apenas nelas.
Algumas pessoas já me disseram, quando discutimos este assunto, “eu
concordo com mantampas, a mim foi o sute que me endireitou” e eu pergunto-lhes
sempre: “mas o que estava errado antes?”
Eu, por exemplo, quando ia brincar com os colegas e voltava depois da hora
do almoço, levava tareia lá em casa. Sim, evitava chegar depois do almoço para
não levar tareia. Mas se calhar, proibirem-me de comer podia ter sido mais
eficiente, eu sei lá (comia na casa dos amigos). A cena é que, como sabia que
já tinha sute à espera, quando a hora do almoço, que variava muito, me apanhava
na rua com os amigos, eu já só voltava à hora do jantar, porque sabia que a tareia
era inevitável… ao menos não interrompia as minhas brincadeiras e brincava
muito antes. (Depois fazia todo aquele ritual de pedrinhas para escapar do
sute: uma debaixo da língua para colocar no pote de água, outra para atirar
pelas costas quando estava perto da casa sem olhar para trás e coisa assim… que
muitas vezes resultava).
A questão da violência não é específica apenas aos educadores, mas a toda a
nossa sociedade que vive sob a “LEI DE KON”. Os mais velhos (mais fortes) batem
nos mais novos (mais fracos) sem precisarem de outra razão fora de porque
podem, na discarna mesmo. Um miúdo parado no meio do caminho pode levar a
coquida de um adulto só porque está parado e ele quer passar, mesmo que o
adulto pudesse desviar-se facilmente. O que faz o miúdo que foi coquido? Vai à
procura de um outro miúdo mais fraco para, por sua vez, coquir também. E de
repente vemos um miúdo de dois anos a riquitir um bebé de dois meses, e dizemos
que não entendemos a razão do beliscão? É agressão transferida.
Os pais são agredidos pelos patrões, que são agredidos pelo Estado, e
frustrados, sem poder dar respostas, vão bater (na mulher, no marido”?”) e nos
filhos, e os filhos nos irmãozinhos, e então a “LEI DE KON” é padronizada dessa
forma.
Professores batem nos alunos, com palmatórias de madeira, mantampa de
serra, cinto, chicote, porque estes confundiram o P com R ou com o B. Eu fui
obrigado várias vezes, quando aluno de primária, a ficar de joelhos sobre
cascas-de-karus ou pedrinhas, não porque não sabia as lições, mas porque
chupava os meus dedos, e diziam que eu já tinha idade mais que suficiente para
deixar de chupar os dedos (chupei-os até aos nove, e só parei porque a certa
atura deixou de saber bem, nenhum sute me impediu de os chupar)… os meus dedos…
os meus próprios dedos… vá, se andasse a chupar os dedos de outras pessoa até
poderia entender, e tenho a certeza de que me matariam se ao invés dos dedos eu
andasse a chupar o pé… eeeeeeeepá.
Somos educados no sute, na “LEI DE KON”, e não conhecemos outra coisa e
aceitamos isso como parte nuclear da educação, e aceitamos a hierarquia
violenta inerente dessas práticas. Por isso, sempre que nos tornamos poderosos,
oprimimos os outros e achamo-nos no direito de o fazer: filhos que oprimem os
próprios pais quando envelhecem; polícias e militares que não sabem o seu papel
e pensam que é bater nas pessoas; o “n’ na mostrau bu lugar”; governantes que
acham que podem mandar prender e bater nos outros porque têm esse poder (que
não consta em nenhumas das nossas leis escritas); e o povo que aceita
tranquilamente o exercício desse tipo de poder (não só violência física),
porque “eeeeeeeeee, pa pa pa pa pa, abo bu na kirtika nan sefi!”.
Não, violência não é educação. A “LEI DE KON” é estúpida e vazia. Se o sute
fosse educação teríamos o melhor povo de mundo e o Prémio Nobel da Educação
iria para.