O senso comum diz: onde acabam os
teus limites começam os meus, sustentando-se no princípio de boa convivência.
Entretanto o mais certo é que isso não é assim tão simples como se diz, na medida em que esses limites na maior parte das vezes são marcas invisíveis e imperceptíveis, ou visíveis, porém, ilusórias, nada mais do que miragens. De qualquer forma não há como negar que este simples princípio consegue estabelecer algum equilíbrio, no entanto, quando as pessoas invocam a liberdade e os direitos, aí a coisa complica.
Entretanto o mais certo é que isso não é assim tão simples como se diz, na medida em que esses limites na maior parte das vezes são marcas invisíveis e imperceptíveis, ou visíveis, porém, ilusórias, nada mais do que miragens. De qualquer forma não há como negar que este simples princípio consegue estabelecer algum equilíbrio, no entanto, quando as pessoas invocam a liberdade e os direitos, aí a coisa complica.
A liberdade nunca pode ser plena,
ela é ultra-condicionada tanto por outros factores como por ela própria (considerando
que a nossa liberdade e o direito a ela tem de se submeter, na maior parte das
vezes – e para a maioria dos mortais, conforme a sua importância social –, à liberdade e o direito a ela de outras
pessoas). Somos livres mas não tanto ao ponto de entrar numa casa alheia e usar
as coisas dela, por exemplo… oh… essa foi demasiado básica… somos livres, mas
não tanto ao ponto de nos mandarmos embora de um emprego quando temos contas
por pagar no final do mês, ou para nos darmos ao luxo de não ter uma conta num
banco qualquer, ou para não nos submeter às filhadaputices das leis
governamentais que nos tramam... hem!, somos livres mas não tanto ao ponto de
agredir física ou emocionalmente outras pessoas.
E é sobre esta parte complicada
da liberdade que eu quero reflectir: a
liberdade de expressão. A liberdade de expressão é uma das mais confusa,
tramada e opressora forma de liberdade de que eu tenho conhecimento; muita
gente pretende que pode dizer o que bem lhe dá na telha sob a alçada da
liberdade da expressão, mas não percebe que embora pareça que possa, talvez não deva usar essa aparente liberdade (e não, não quero ir para o
sempre aclamado e vulgar direitos e
deveres).
Em nome da liberdade de expressão
faz-se declarações difamatórias, publica-se o ódio, publica-se a estupidez,
chama-se de estúpido aos estúpidos, aos iluminados e aos pseudo-iluminados, sem
discriminação, desde que não estejam de acordo com a nossa forma de pensar. Eu
mesmo que estou praqui a falar, por exemplo, ao escrever uma crítica sobre um filme que não gostei, chamei de pseudo-intelectuais
àqueles que disseram que gostaram, e digo, em minha desculpa, que tenho os meus
motivos para isso e justifico-os. E é isso que toda a gente faz quando usa da chamada
liberdade de expressão, agride os
demais e justifica a agressão.
O que não faltam por aí são
artigos escritos por pessoas cultas (considerando as citações que fazem), académicas
(por causa da estrutura séria dos seus textos) e bons escritores (porque os
textos têm ritmo e são bem redigidos e apelativos), feitos à bandeira da liberdade de expressão, mas que não
passam de um atropelo à expressão da liberdade: textos misóginos, textos
racistas, textos homofóbicos, textos partidários, textos religiosos, textos
ateus, textos eteceteristas; e quanto com mais cultura são escritos, mais perigosos são, porque se baseiam sabiamente (mas de forma errada) em justificações bem manipuladas que, sem um pensamento crítico da parte de que os lê, induzem em erro.
Há uma confusão constante, as
pessoas julgam que a liberdade de expressão é uma expressão de liberdade, pois
devia ser, mas considerada no plano ético, onde temos o tríptico: eu, tu e nós, vemos que restringimos a
nossa liberdade quando só respeitamos um dos elementos desta santíssima
trindade e fazemos pouco caso dos outros. Quando só olhamos para o próprio
umbigo, quando só julgamos que a nossa opinião é que conta e quando fazemos
tudo para defender essa opinião e o direito de a ter, o que poderemos esperar
que a alteridade faça? É aqui que triunfa o príncipio de os meus limites e os
teus.
Por exemplo, lembro-me de alguém justificar
que tem o direito de não gostar dos gays e de não os querer perto de si. Pois,
faz sentido, tanto quanto o meu sobrinho tem o direito de não gostar de
repolhos. Porém, os repolhos são para serem comidos, não têm decisão na
matéria, mas um gay tem (ou devia ter) os mesmos direitos que esse alguém que
não os quer por perto, e, voltando à santíssima trindade, percebe-se facilmente
que apenas o elemento eu fica em
desvantagem diante dos outros dois.
A questão da liberdade é
complicada, a da liberdade de expressão é estupidamente mais complicada ainda, mas
talvez se simplifique se pensarmos que se com ela estamos a pôr em questão a
liberdade de outras pessoas é porque não faz sentido e é prejudicial. Como por
exemplo disse alguém inteligente, se há muitas pessoas heterossexuais solteiras
que não querem casar-se e acham ridículo o casamento, mas ninguém lhes acusa de
estragar a seriedade casamento por isso, por que raio acham que os homossexuais
que querem casar-se (entenda-se, respeitam essa instituição) é que vão pôr em
risco o seu significado?
Sem esticar mais, e não me
sentindo muito claro e inteligente hoje, vou acabar aqui o artigo e deixar a
sugestão de que quando a nossa liberdade
de expressão agride qualquer expressão de liberdade, pondo em risco o tu e o
nós (considerando que se o eu
atacar o tu, este reage atancando o eu, e o nós deixa de existir), então o mais certo é não fazermos o uso
dela.