A HUMANIDADE É SIMPLES
A humanidade é tão complicada que
acaba por ser simples, ou seja, por ter uma definição simples, ou simplista,
resumida em: a humanidade é complicada.
Entretanto, filósofos e promotores de autoajuda têm andado a tentar
convencer-nos de que não, que a humanidade não é complicada, que nós é que
assim a fazemos. Daí põe-se a questão: se
nós não somos complicados como conseguimos complicar? Não consigo perceber
como é que o simples consegue complicar, da mesma maneira que me faz espécie
que Deus, um ente perfeito, tenha criado a imperfeição.
Se o homem fosse simples não
teria complicado o seu viver. Tentamos fugir da complicação criando sistemas
binários ou dualistas, resumimos tudo em ou bem ou mal, ou preto ou branco, ou
ser ou não-ser, ou 1 ou 0, mas todos sabemos que tirando os computadores e as
pilhas, nada funciona com dois polos apenas, até mesmo os bebés sabem que por
vezes têm de deixar de chorar e de ceder aos caprichos dos pais.
Eu entendo como um insulto à
natureza humana chamá-la de simples quando na verdade ela não é, e quando quanto
mais complicada mais o homem gosta. Senão vejamos, aplaudimos mais os discursos
que não entendemos. “Oh, ele falou tão bem e tão bonito… mas não entendi nada”.
Gostamos mais de poemas complicados e com vocábulos que não conhecemos,
despendemos tempo a observar e a elogiar um quadro que não nos diz nada,
simplesmente porque desconfiamos que haja sempre uma montanha de significados
obscuros ou simples quaisquer escondidos atrás dessas coisas que não entendemos,
e temos o receio de dizer gritar simplesmente: o rei vai nu! Pois! Vai! Mas e não estiver nu? Se todos o vêm
vestido quem somos nós para dizermos que vai nu? Eu vejo-o nu, mas será essa a
verdade? Pois! Não se sabe, porque na verdade… na verdade a verdade é
verdadeiramente variável, tanto pode ser como não ser sem deixar de ser
verdadeira. Eu explico: pense-se nos conceitos da lógica aristotélica e na
álgebra booleana dentro da tigela da teoria da relatividade. A observação depende do ponto de vista do observador
e o simples facto de haver um observador altera o resultado da observação.
Não sei quem disse isso, mas acredito nele. Sendo assim, pode-se dizer que
existe o Ser, o Não-ser, o Ser-que-não-é e o Não-ser-que-é, sendo que o
Ser-que-é é o Ser, e o Não-ser-que-não-é é, neste caso, em vez de Ser, um
reforço à negação do Não-ser. Mas o Ser para um pode, ao mesmo tempo, ser o
Não-Ser para outro, como sabiamente se diz: a boa-vida do carrapato é a dor do cão.
Pode-se ver nas últimas frases
como é tão complicadamente simples a humanidade. Ou por outras palavras, a
humanidade não é simples, nós é que a queremos simples e o less is more, dito por não sei quem [agora sei que é uma frase de
Van Der Rohe], é uma ilusão, nós desejamos mais, mais e mais, e cada vez mais
complicado, porque a simplicidade é aborrecida. Mas, quando não nos sentimos
capazes, queremos tudo simples, pelo menos para nós, os outros que o tenham
complicado.
Dizemos que a humanidade é
simples, porque preferimos crer que assim seja, acreditando que a fé move
montanha. E, se calhar, sim, a fé move montanha… montanha de treta. É uma
metáfora, eu sei, não era para ser levada à letra, mas eu diria, os braços
movem montanha, a fé só incentiva os braços a moverem, quando o chicote não o
faz (o caso do imperador romano que mandou cortar uma montanha que lhe tapava a
vista, ou os egípcios que erigiram as montanhas-esfinges). A fé, não importa de
que tipo, é um grande motivador e um item muito importante para fazer as coisas
acontecer. Que seria de nós sem a fé? Sem a fé e sem a esperança? Até nem sei
dizer qual das duas é mais importante ou mais útil, visto que uma gera a outra.