Mostrar mensagens com a etiqueta OUVINDO CINEMA. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta OUVINDO CINEMA. Mostrar todas as mensagens

3 de janeiro de 2014

CLARA DI SABURA, 2011

A Guiné-Bissau não tem uma tradição de cinema muito bem construída, ou construída sequer, são parcos os filmes guineenses, e o único realizador mais ou menos, ou talvez, conhecido é Flora Gomes. Existem alguns filmes e uns pares de documentários que constituem todo o volume do cinema guineense, e, não tenho a certeza, mas não perfazem duas dezenas. E há já um bom tempo que não se fazia um filme com intenção de ser cinema (não conta o último filme de Flora Gomes, Republica di Mininus, com Danny Glover – aliás, escrevi este artigo há já ano e meio), tirando alguns vídeos amadores de teatro-fora-de-palco, com câmaras estáticas, realizados aqui e além por alguns curiosos, os quais, apesar da sua terrível ou ausente qualidade cinematográfica, fazem a delícia dos meus compatriotas, por serem produtos com os quais se identificam. E é claro que gosto de ver alguns deles, mas só porque têm um amigo meu como protagonista.

Ok! É neste meio árido que surge o filme Clara di Sabura, construído com uma mão mais cuidada, porque aspirava a ser cinema, e por isso estou a falar dele como cinema, usando o mesmo padrão de avaliação que uso para os filmes que vejo.

Clara di Sabura é um filme muito amador, adaptado de um poema pseudo-moralista (eu disse pseudo, porque no poema o maior atributo de uma boa mulher é encontrar um homem que a case) e o filme não foge do tema, mantém a mesma linha construída pelo poema e faz um rol de discursos ocos e repetitivos, e apesar de querer mostrar a importância que estudar e formar-se pode ter na vida de uma mulher, não consegue esquivar-se de submetê-la (a mulher, é claro) a um poder masculino (e olhem que nem sou feminista).

Eis a sinopse: Clara é uma adolescente sem cabeça para os estudos, preferindo pôr-se bonita e usar a sua beleza para se safar. E toda, mas toda a gente lhe admoesta, dizendo-lhe que está errada, desprezando-a, tanto à sua frente como ao seu atrás (de maneira que lhe alcunham de Clara di Sabura – traduzido em Clara que Gosta Apenas de Bela-Vida, do Bem Bom, da Facilidade, de Festanças, etc…), e toda essa gente advoga, no entanto, estar preocupada com o futuro da Clara. E um dia (ou anos depois), Clara é chamada para trabalhar numa empresa e não sabe ligar o computador.

Eu sei que a intenção do filme era que fossem genuínas as admoestações que as pessoas faziam à Clara, mas como diz o ditado considju dimas i inveja (demasiados conselhos é inveja), por isso, o efeito que consegue é o oposto do pretendido, o que vemos, após as duas primeiras pessoas terem acabado de falar da Clara (ou com ela), é que ela está rodeada de pessoas invejosas, coscuvilheiras e cheias de más-línguas, típico de lugares onde as pessoas não têm mais nada com que se ocupar.

No entanto, se tirarmos todos esses momentos de más-línguas, não resta nada em Clara di Sabura, talvez apenas mais uns vinte minutos de quase nada, o que mostra a grande falta de ambição do filme (entenda-se que não estou a dizer que o realizador não tivesse sido ambicioso, mas o filme como resultado não é). A promoção do filme é mais ambiciosa do que o próprio filme.

Um dos maiores problemas de Clara di Sabura é a sua unidade temporal: simplesmente não existe. O filme começa com uma Clara adolescente que estuda no ciclo e dorme com um professor para obter boas notas (e ninguém condena o professor), e avança para uma Clara seduzida por um ministro (ainda adolescente?), ou algo assim, e não sabemos mais o que acontece. No próximo segmento, dá-se a entender que já se passaram alguns meses, pelo menos, e a seguir vemos que entre ela e o ministro parece que se passaram apenas umas semanas e que tinham acabado de se conhecer, para logo a seguir ela encontrar uma colega do ciclo que já tinha concluído um curso superior, já trabalhava e já era casada, para percebermos que já se tinham passado muitos anos, mas os actores não envelheceram. Não existe um tempo para a história, porque ela está mal estruturada, o argumentista só quis falar mal da Clara e por isso não ficou atento ao resto.

extracto do filme
o filme todo pode ser visto no youtube

Outros problemas de Clara di Sabura são a edição e a direcçao dos actores e os próprios; quase todos eles amadores, o que não é nenhum problema, porém maus como tudo, nem mesmo o Mário (o amigo atrás referido) se safa (este a pescar para o filme um bocado do seu personagem de Barudjo – um personagem que interpreta num vídeo) ou a Neia (esta última fazendo a sua especialidade teatral - chorar, babar-se e lamentar-se – é a sua imagem de marca), com discursos intermináveis sobre o valor de mulher, que praticanente se resume em saber cozinhar (talvez porque o homem se agarra pelo estômago). Os dialógos não são naturais, todos actuam como se estivessem a fazer teatro, num tipo de teatro também já ultrapassado, onde as frases são debitadas como poesias.

O que podia salvar Clara di Sabura era uma desenvolvimento mais ambicioso, em vez de simplesmente falar mal da personagem. No poema pode funcionar, mas no cinema não, porque a estrutura dos dois é diferente, um poema descreve, metaforiza, sugere, abstracta-se, concretiza-se, usando para isso palavras, o cinema usa imagem, por isso, tem de focar-se mais em mostrar do que descrever, e nisso o filme falhou. Ah, também, a tradução e a legendagem são terríveis.

Talvez, este é o meu ponto de vista, se o filme se focasse em vez de na Clara, nas pessoas que a rodeiam, já que quer fazer um retrato social, mostrando antes de mais a maleita da nossa sociedade que, por não fazer nada, por não ter ocupações, concentra-se mais a falar da vida dos outros, ao invés de focar-se na própria (o que depois se revela num país onde falta acção e, portanto, mantém-se estagnado), promovendo uma certa reforma de pensamento, mostrando que é necessário cultivar outros valores; Ou então, mostrar uma sociedade onde, por falta de oportunidades, as pessoas vêm-se obrigadas a usar as armas de que dispõem para triunfar, no caso da Clara, a sua beleza, e em vez de atacá-la simplesmente por esse motivo, talvez atacar os ministros, os professores e os poderosos que fomentam essa prática; se o filme procurasse mesmo os verdadeiros males em vez de simplesmente falar mal das pobres e manietadas mulheres guineenses numa perspectiva machista a beirar a misoginia, talvez Clara di Sabura pudesse ter um estrutura séria.

Para fechar, digo, Clara di Sabura é um filme muito mau e sem ambição, no entanto, louva-se a ambição dos que nele trabalharam. E, prevendo já o ataque dos meus conterrâneos, digo: falar aqui do filme, negativamente ou não, é uma publicidade que estou a fazer dele.

1 de abril de 2013

LOOS ORNAMENTAL, 2008


O documentário Loos Ornamental, relizado por Heinz Emighloz é tão maçante e dá mais sono do que ouvir o Vítor Gaspar nos seus monocórdicos discursos a fazer ensaios fictícios sobre como saldar a dívida com a Troika. Eu explico (não a parte do Vítor, é claro).

Cinema, do grego, movimento (hoje também tido como o espaço onde se projectam filmes), é uma técnica de usar uma sequência de fotografias de modo a criar a ilusão de movimento, é uma forma de contar uma história.

O cinema mudou muito ao longo do tempo, mas uma constante, desde os primórdios da sua existência, quando os homens da caverna projectavam sombras nas paredes para contar como é que foi um emocionante dia da caça, foi sempre o movimento. Cinema é um conjunto de imagens sequenciais, de fotografias interligadas para dar um sentido, um conjunto de pontos que forma uma linha, geometricamente falando. E assim mostra-se, senão superior, pelo menos maior que a fotografia.

Dito isto, quando se vê Loos Ornamental, o que se chega à cabeça é: mas que raio, isto não é cinema!, e não no sentido de um filme caseiro qualquer não ser também cinema, aliás, a própria ideia de filme é violada com Loos Ornamental.

excerto do filme

Podia-se dizer que Heinz Emighloz simplesmente inverteu o conceito de pôr a fotografia em movimento para fazer cinema, e revolveu pôr o cinema em estática para parecer fotografia. Teoricamente é um bom exercício de masturbação mental, o conceito, é certo; mas na prática funciona tão bem como a licenciatura do Relvas. Quer dizer, a licenciatura está lá porque foi dada e é assim chamada, mas é tão vazia de sentido e sem conteúdo.

Adolf Loos, como aqui já referi, é o meu arquitecto de eleição, por isso a expectativa com que fui para o documentário e o entusiasmo eram muito altos, e fomos defraudados, tanto eu como Loos, considerando que o filme podia ter sido feito em Power Point com melhores resultados, na medida em que é um conjunto de planos estáticos das obras de Loos filmadas por uma câmara, e quando não há uma cortina a mexer tornam-se indistinguíveis de fotografias. As imagens, como se pode ver no excerto, são intevaladas por uns dez segundos ou mais, e assim, em sequência fazem o filme, sem narrativa e sem música (ai, que chato).

É certo que as obras de Adolf Loos falam por sim, mas se o próprio dizia que não gostava de fotografias porque manipulam a visão do espaço, como é que Heinz Emighloz vem fazer-lhe uma homenagem usando fotografias apenas, quando possui uma ferramenta que lhe permite ir mais além? (aliás, mesmo que Loos gostasse de fotografias, o filme continua mau) É como sair de submarino para ir fazer vela (nenhuma conotação com o Portas, entenda-se.)

Bruno Zevi, no seu Saber Ver Arquitectura (livro do qual ainda vou apresentar uma resenha aqui), dizia que as revista não ensinam a ver arquitectura porque falta-lhes a dimensão do movimento, a quarta dimensão, e por isso, quando Heinz Emighloz pretere da ilusão da quarta dimensão para mostrar arquitectura, o resultado só pode ser um: mau. E o pior é a ausência de narrativa e existir apenas o barulho natural de fundo quando filma em espaços exteriores, o que também não resultou muito bem, pois vários documentaristas (Herzog, por exemplo) fazem-no e resulta bem, pois cria momento quando o recurso é usado pautadamente, mas quando é uma constante, aborrece.

Entretanto, o pior de tudo é mostrar obras de Loos sem falar de Loos.

Loos dizia-se contra ornamento, mas referia-se às mariquices da art decor entre outras coisas, porque os seus espaços interiores eram muito bem ornamentados (e caros, só para quem pudesse pagar), e convinha dizer isso, pois quem não sabe de Loos, vê o documentário e no final, continua a não saber de Loos. É necessário falar das técnicas de Loos, das suas ideias, mostrar as plantas, etc, porque de contrário, o que se obtém é um filme para turistas comuns (usando a comparação de Zevi), quer dizer, vê-se tudo e mais alguma coisa, sempre com a pressa de seguir em frente para ver mais, mas sem perceber claramente a dimensão do que se viu.

Loos Ornamental não seria mau se tivesse sido uma exposição ou um livro, no entanto, tem uma boa nota no IMDB, provavelmente atribuído por alguns intelectuais, daqueles que mastigam papel e filosofam que não sabe a lasanha porque a realidade é ilusória (os que não vêem que vai o rei nu - adoro esta metáfora). Mau Emighloz, mau.



18 de setembro de 2012

VINGADORES, OS, 2012 (The Avengers)

Existe o cinema arte e existe o cinema entretenimento e o segundo abusa mais da técnica, muita forma pouco conteúdo, e não se preocupa muito com a dimensionalidade das personagens ou enredo rebuscado. E Os Vingadores faz parte do segundo grupo. Seguindo à risca a linearidade de uma banda desenhada infantil, apresentando uma realidade a preto e branco (o que não admira e nem deve, considerando que o filme é sobre um punhado de heróis da Marvel), onde os bons batem nos maus e saem todos incólumes no final.

Sim, Os Vingadores é isso, básico até não mais, dois grupos e um motivo para andarem à pancada com o outro, sendo que o o outro grupo é completamente anónimo, sem cara e genérico. No entanto, apesar disso, não se pode dizer que aos personagens principais falta dimensionalidade visto nos terem sido apresentados em vários filmes anteriores, por isso neste apenas se limitaram a seguir a trilha. O problema é que tens de ver os outros filmes para este se sustentar, senão perdes-te.

Entretanto, Os Vingadores é o melhor filme da Marvel feito pela Marvel (ainda continuo a preferir os X-Men: O Início) extremamente superior aos insossos Capitão América e Thor e o segundo Hulk (ainda continuo a achar o de Ang Lee bom o suficiente). Apesar de ter seis heróis a disputar os 120 minutos do filme, não contando com o Nick Fury (que foi emprestado do universo Ultimate e não da Terra 616), o ecrã foi muito bem dividido e muito equilibrado, e os minutos finais de acção demonstraram mesmo como isso foi bem pensado, o que se vê nas sequências interruptas como ela foi mostrada (tirando os momentos que cortavam para pôr Fury na tela); por exemplo, seguia-se o Homem-de-Ferro que levava a acção à Viúva Negra, que a entregava ao Hulk ou outro qualquer, e assim por fora. Foi um quadro gigantesco e soberbo, meticulosamente bem trabalhado.

trailer

Momentos cómicos também houve, sendo Hulk o responsável pelos melhores, e ainda até tentaram iscar-nos com um momento meloso de drama romântico entre dois heróis, os não super, que no entanto não resultou.

Não tenho nada de pseudo-sócio-filosófico para analisar sobre o filme, porque não tem ensinamento nenhum e nem a pretensão disso, é americanamente panfletária como todos os filmes americanos, e não faz nada senão respirar acção e entretenimento. Se gostas de filmes com cérebro ou algum cérebro, passa longe, ou veja X-men: O Ínicio (esse tem um bcadinhinhinho), se queres só pancadaria, Os Vingadores fazem-te as honras.

21 de agosto de 2012

MEU NOME É KHAN, 2010 (My Name is Khan)


Meu nome é Khan e eu não um terrorista.

Eu sou tão emotivo que as lágrimas e os meus olhos andam sempre de mãos dadas, e como a especialidade do cinema indiano, pelo menos nos tempos em que eu era grande consumidor dos seus filmes (qual praticamente 98% dos guineenses), é apelar a emoções fáceis e enternecer para fazer chorar, não foi assim tão difícil verter lágrimas por causa do filme. 

Não tenho visto muito cinema indiano ultimamente, mas no Meu Nome é Khan (Khan, do epiglote) percebe-se bem a gramática de Bollywood impregnada. E não estou a falar mal, é um cinema diferente (embora cada vez mais americanizado), colorido e vivo, quando o argumento não peca, é claro. Mas, basta disso… vou falar do filme.

Eis a sinopse: Khan é um muçulmano indiano que vive nos EUA pós-11-de-Setembro, ele é íntegro, trabalhador, boa pessoa, porém, o ódio e a discriminação orientados para os muçulmanos a partir de então complica-lhe a vida. E para piorar a situação, ele sofre de síndrome de asperger (outro filme que retrata bem esse problema é Mary e Max). Por causa de uma interpretação literal, próprio dos aspies, porque eles não conseguem entender a ironia ou o sarcasmo (ah… procurem sobre o assunto), Khan vê-se com a tarefa de encontrar o presidente da américa, Bush, para lhe dizer que não é terrorista.

trailer

A abertura do filme mostra já a preocupante situação dos muçulmanos e comunidades árabes nos EUA, e de como a liberdade deles está muito condicionada e como a paranóia em relação a todos os muçulmanos serem potenciais terroristas está implantada na população americana… americana? Na população global. Eu sei que existem ayatollahs que publicitam o ódio e prometem virgens a suicidas em nome da fé… sim, existem… até no próprio filme aparece alguém assim, entretanto acreditar que qualquer um que diga Alá em vez de Deus é terrorista é preconceituosamente discriminatória.

O filme tenta lidar com vários problemas, o dos aspies, o da discriminação aos muçulmanos na América e o do conflito muçulmano-hindu, e Kahn acaba por ser a pessoa a estabelecer a ponte entre todos esses problemas, sendo o neutro da questão, porque para ele só existem dois tipos de pessoas: as boas que fazem coisas boas e as más que fazem coisas más, e o resto: a cor, o credo, a nacionalidade é mais secundária… e isso tentou-se mostrar através duma comunidade preta de sul da qual ficou amigo.

Meu Nome é Kahn é um bom filme, mas longe de ser perfeito, porque a certa altura tornou-se todo fabuloso, plástico e irreal, e não consegue esconder o molde, e por tentar tratar de muitos problemas ao mesmo tempo por vezes parece que perde o foco. No entanto, a grosso modo vale a pena ser visto. Boa banda sonora, bons momentos de humor, apelo às lagrimas, boa representação por parte dos actores principais, uma direcção sólida que beira à teatral algumas vezes (só para constar), e uma fotografia bonita que aproveita para fazer da cidade outro personagem. Altamente recomendável, senão pela história em si, pelo menos pelas preocupações que ressalva.

31 de julho de 2012

PURO AÇO, 2011 (Real Steel)


Dois robots a lutar, que piada tem? Foi isso que pensei quando vi a promo de Puro Aço; nem o nome de Hugh Jackman, ou Steven Spielberg na produção, me convenceu; talvez se passar num domingo à tarde na TV e eu não tiver nada para fazer eu veja o filme, concluí. No entanto, estava duplamente enganado, não só acabei por ver o filme, como gostei dele.

Apesar de tudo, Puro Aço é mesmo um filme para um domingo à tarde, para um serão tranquilo e agradável com os sobrinhos. É um filme muito simpático e ritmado, com zero de profundidade, todo a cheirar a Disney, aliás é da Dreamwork, mas que consegue enlear durante a sua duração. 

Previsível? Como o caraças. É uma mistura de Rocky com Over the Top (acho que já tinha usado algures esta mesma comparação), um pai irresponsável com um filho que lhe cai ao colo de repente e que, acima de tudo no mundo, quer ser amado por ele e blá-blá-blá e foram felizes para sempre.

No entanto, o melhor do filme mesmo é ver Dakota Goyo a roubar as cenas a Hugh Jackman.

Eis a sinopse: No futuro qualquer actual e alternativo, um ex-boxista, modalidade que já não se usa nos moldes que conhecemos, tendo os lutadores substituídos por robots, passa a vida a viajar com o seu robot participando em jogos. Um dia, recebe a guarda do seu filho que nunca viu mais gordo na sua vida e este descobre um robot antigo e ultrapassado num ferro-felho e começa a participar nos circuitos de luta com ele e vão subindo e subindo até competir com os gigantes.

trailer

É assim Puro Aço, entretanto pelo meio temos uma história de amor meio desequilibrado, uma história de relação pai-filho, e alguns momentos que rapidamente esquecemos entre as divertidas cenas de luta. A fotografia é boa, os efeitos visuais são bem feitos e suportam bem o filme. E tem umas duas sequências de meter inveja a vários video-clips.

Como me disse aqui uma vez alguém, há filmes que vemos só para entretenimento mesmo e não procuramos tirar dele nenhuma lição, este aqui é um deles, embora venha imbuído de algum moral de digestão fácil. No geral, Puro Aço é um daqueles incentivos de auto-ajuda que promove: não deixes que a tua origem te limite o destino.

Um filme divertido para a família.


21 de junho de 2012

FEITIÇO DO TEMPO, O, 1993 (Groundhog Day)


O Feitiço do Tempo foi o filme que me calhou esta semana (já não sei qual semana, porque há já meses que tinha isto para transcrever); não gosto de rever filme, principalmente quando há muitos em fila a clamar pela minha atenção, no entanto tem aqueles que não conseguimos deixar de acarinhar… e este é um dos meus.

Não vou falar de Bill Murray, nem de Andie MacDowell (como é hábito não fazer, embora por vezes não consiga evitar), resumo os dois nisto: funcionam bem juntos.

O Feitiço do Tempo, por causa da abordagem, não parece um daqueles filmes que grita furiosamente: qual é o sentido da vida?, aliás, nem faz a pergunta, apenas ensina qual é o sentido da vida. Analisado o trama, é análogo aquelas teorias hindus de reencarnação, com a diferença de que aqui, o herói (ou a vítima) tem o conhecimento da sua vida anterior. Também o filme parece um dos inúmeros ensaios de Phillip K. Dick: e se eu tivesse o conhecimento do futuro? Um filme similar ao feitiço do tempo é “12:01”, similar na premissa, mas diferente na abordagem… e na qualidade, é claro.

Eis o enredo: Phill é um jornalista do tempo (isso faz sentido?), muito arrogante, egocêntrico e convencido da sua importância, que ao cobrir um acontecimento inútil e irrelevante numa cidade fica preso no mesmo dia, repetindo-o vezes e vezes sem conta. Torna-se desesperadamente solitário, visto ser o único que percebe que o dia não muda, e o seu único consolo acaba por ser a sua colega, Rita, por quem se apaixona e tenta diariamente fazer-lhe ficar apaixonada por ele.

trailer


Há diversas maneiras de abordar O Feitiço do Tempo, mas eu prefiro este: O que eu faria se eu tivesse o conhecimento do futuro? Aqui, por os dias serem todos iguais, o fardo é acrescido, porque não só se tem o conhecimento do futuro, como a monotonia é tanta que não faz sentido ficar nela preso; e por os dias serem o mesmo deixa de existir o Tempo: o futuro e o passado acabam por ser um eterno presente.

Se o filme tivesse um monte de frases filosóficas e tretas esotéricas à la Matrix (e houvesse o hype internáutico) poderia ter sido um cultuado filme de ficção científica, porém, embora aborde uma questão séria (?) ele não passa de uma comédia moralista para um domingo à tarde, que fala fundamentalmente de “egoísmo, abnegação e altruísmo”, estes últimos tornando-se a chave para resolver a questão, ficando a moral da história a ser:  a vida não tem graça se for vivida hedonisticamente, e a melhor forma de usá-la é em função dos outros.

Outra maneira de abordar o filme é a forma desconcertante como Phil tem manipulado os outros ao seu redor, com o conhecimento do que vai acontecer, e como o conhecimento é poder.  

Mas... como bónus, o filme tem uma óptima banda sonora.

6 de maio de 2012

TRIPPING THE RIFT: THE MOVIE, 2009


Sempre que num título aparecer “The Movie”, não tenhas dúvida, ela é proveniente de alguma obra de um outro campo artístico, usualmente a nona arte ou a televisão, porque filmes baseados em livros (literatura, digamos assim) não trazem essa indicação.

Com isso quero dizer que Tripping… é uma série de televisão que, por acaso, nunca vi, mas pelo que vi no filme suponho ser ácido e satírico, um cruzamento bastardo de Futurama e South Park, mas que, no meu entender, só se limita a bulir com os famosos e não faz realmente uma crítica social, como o último, pelo menos no filme.

Tripping… não tem propriamente um argumento, é um conjunto de Sketches colados uns aos outros por uma desculpa cómica que pretende ser o argumento, que é a história do Arnie-1000, um palhaço robot que volta no tempo para matar Chode (o capitão da nave, que tem uma característica antagónica de todos os grandes capitães de ficção científica, por ser feio, porco e mau) com direito ao sotaque de Arnie e tudo, até algumas linhas como o famoso “I’ll be back!”. Pelo filme faz-se uma visita a Transilvânia, a terra do Conde Drácula, anda-se pelo Frankeinstein, pela Ilha de Tesouro, pela Donas de Casa Aborrecidas, quer dizer, Desesperadas, e provavelmente por algum outro filme ou série não alcançado pelos meus limites.

trailer

Tripping... leva-nos a viajar com estes personagens crus e egoístas, mas que prezam a amizade que sentem um pelo outro. As características físicas dos personagens reflectem o seu lado psicológico também, mas isso pouco importa. Da tripulação fazem parte, Chode, o capitão sacana; Gus, o robot gay; Whip, um camaleão preguiçoso; T'nuk Layor (royal kunt), uma minotaura invertida; Six, uma cyborg programada para sexo; e Bob, o computador que controla a nave e é agoráfobo. São estes que tripulam o Júpiter 42 e proporcionam-nos momentos de riso, principalmente pelo politicamente incorrecto.

O filme é bem cómico, não para ver com as crianças devido ao seu tema sem nenhum propósito moral e à sua linguagem e cariz sexual, mas acho que serve para passar uns bons minutos, mesmo que seja só para ouvir a imitação do sotaque do Arnie, pois não é nada de imperdível.

21 de fevereiro de 2012

REGRESSO DE JOHNNY ENGLISH, O, 2011 (Johnny English Reborn)


Sinceramente não me lembro da última vez que me ri tanto com um filme como com este O Regresso de Johnny English. Não sei se foi tudo mérito do filme ou se foi uma predisposição criada pela minha companhia. No entanto, pela minha avaliação, a primeira hora do filme pode ser dividida em um riso por cada cinco minutos e uma gargalhada por cada (mais ou menos) oito, considerando que algumas piadas não são plásticas, mas rebuscadas.

Não haja dúvidas que Johnny English se vale de Atkinson e do seu humor físico, e apesar da previsibilidade do filme, não deixam de ser engraçadas as situações. No entanto a última parte do filme foi bastante morna. E uma das coisas que saltam mais à vista aqui é que Johnny está mais Johnny English e menos Mr. Bean. No entanto, ainda não se distância tanto para evitar comparações com o Inspector Jacques Closeau, embora já manifeste mais identidade.

Ri-me tanto que fiquei com dores na barriga, e quando me falam de filmes de comédia é disso que quero saber. O argumento não é complexo, é ultra-linear que nem chega a existir, pois pensaram primeiro nas cenas cómicas e depois colaram-nas com pastilha elástica para parecer concatenado, de tal maneira que ficou buracos e situações sem sentidos, mas… eu quero lá saber disso, que importa aqui o argumento?, tudo o que quis foi rir-me e ri-me.

trailer

O que destaco no filme é a presença de Daniel Kaluya, que tenho visto em séries inglesas e aprecio o trabalho e espero que tenha bastante mais sorte no grande ecrã, principalmente porque se ele não se eclipsa nas cenas com Atkinson só quer dizer uma coisa: é mesmo bom.

E também destaco uma das perseguições de automóvel mais patética que já vi em cinema, ou devia dizer de cadeira de rodas?

Johnny English é uma comédia e pêras, podes ver sem pensar duas vezes e sem pensar enquanto vês.

13 de fevereiro de 2012

BUNRAKU, 2010 (Bunraku)


Foi o nome Woody Harrelson que me fez querer ver Bunraku, porque me parecia uma produção japonesa, e de Japão eu adoro são os desenhos, pois depois de alguns fracassos chamado cinema que vi deles nos últimos meses, agora tento fugir de quase tudo que tenha estas duas palavras juntas: cinema, japonês. Depois vi que Ron Perlman também vinha no pacote e pensei: pode ter aí coisa boa!, embora o último filme que vi com Ron Perlman, Conan, tenha sido uma decepção. E Demi Moore a tentar respirar de novo realmente não me atrai muito, e, chamem-me de machista, mas vejo filmes de pancadaria por aqueles que distibuem a pancada e não pela fêmea frágil a precisar de ser resgatada.

Bunraku é um filme cheio de estilo, muita pausa, muito pop, muito campy, mas sem conteúdo. É um Scott Pilgrim de segunda qualidade, mas com um estilo rivalizável; segunda categoria porque quis levar-se a si mesmo a sério, mostrar que podia ensinar algo no meio de todo aquele fogo-de-artifício, e acabou por ser mais supérfluo que o próprio fogo-de-artifício. Quis apresentar lições de moral, metidas com frases pseudo-filosóficas mal escondidas pelo retalho que chama de argumento e sujou-se todo.

As história é sobre um cowboy e um samurai, a cheirar a anti-hérois, que vão parar a uma cidade onde têm de ser os bons e unir-se para exterminar a maldade e purificar a cidade, qualquer coisa como The Warrior's Way (que por acaso foi estreado quatro dias depois de Bunraku).

trailer

No entanto, como disse antes, Bunraku tem uma trama fraca e linear, mas é muito estiloso, e vale por este último. O genérico, o prólogo do filme foi estupendo, a mistura do cenários maquetizados, desenhados à mão, gerados por CGI, cheirando por vezes a animé, a fotografia, a luz, a transição das cenas, ângulos de câmaras ousados (e mesmo os batidos), são os pontos fortes do filme. A edição das cenas de luta não é lá das boas, como a maior parte de filmes de acção hollywodianos, onde a câmara move mais do que as pessoas, ficamos por vezes sem saber o que estamos a ver, no entanto consegue ser bastante sólida em algumas sequências, e a edição de som também em cenas de luta é bastante confusa, por exemplo, há vezes em que vemos um pessoa a levar com pau e o som que ouvimos é de dois paus ocos a baterem um no outro, ou por vezes soa a choque metálico, acaba-se por não se saber se foi intencional ou simplesmente erro (embora duvide desta segunda hipótese); entretanto, para compensar temos sequências que parecem jogos de computador (que lembram o Super Mário a apanhar moedas, pelo menos na parte sonora) e são umas das melhores do filme. Não é nada de novo, aliás “Simpsons did it”, mas tem a sua independência e originalidade.

Tem uma cena onde dois gajos dançam valsa enquanto lutam que é simplesmente soberba. A experimentação narrativa, ou o modo de conduzir a história, como diz a voz em off, faz a graça de Bunraku. Mas no final pergunta-se: o que é Bunraku? Que me diverti a vê-lo, sem sombras de dúvida; que me lembro dele, não muito bem, só sei que é cheio de pinta e vale por isso… e guardei uma frase: há sempre alguém que pode vencer-te! Atenta-te Scott Pilgrim.

8 de fevereiro de 2012

OUTRA TERRA, A, 2011 (Another Earth)


Quem me lê está farto de saber que gosto de ensaios filosóficos, mas não gostei d’A Outra Terra, não por causa do tema, mas pela abordagem, porque de repente comecei a sentir-me untado com banha de cobra.

A Outra… parece-me (e é realmente) dois filmes que foram ligados violentamente por choque lateral, resultando daí que as perguntas que poderia ter levantado permaneceram no caixão estiradas. Vejam por vocês mesmos, vou fazer a sinopse:

Rhoda faz um acidente de viação que resulta na morte da mulher e do filho de um músico famoso. Quatro anos na prisão por homicídio por homicídio involuntário ela saí destruída e destituída de propósito. Então para corrigir o passado entra na vida do destruído músico sorrateiramente e acaba por criar um novo propósito para este, ganhando ela mesmo o seu.

Paralelamente, surge uma Terra para lá do Sol, igualzinha à nossa e a tentativa de contactar essa Terra demonstra que não só era uma cópia exacta da nossa, como as pessoas que lá vivem são também reproduções nossas e tiveram o mesmo percurso.

Esta parte das Terras podia criar infinitas interrogações se os argumentistas tivessem trabalhado apenas nessa premissa, porque a outra, aquela de cima, funciona bem e independente desta, mas não o fizeram. E assim A Outra não tem nada a ver com a outra Terra, e quando muito só faz umas sugestões que faz pedir por mais e, sadicamente, não no-lo dá. O filme mesmo é sobre Rhoda e sobre as perguntas que todo o mundo faz: poderia eu ter uma vida melhor que esta? No entanto prometem um espelho que nos podia mostrar essa possibilidade e logo a seguir cobrem-no com um pano e tudo o que podemos fazer é pensar: só podem estar a gozar comigo!

trailer

Não obstante, A Outra… é um filme digestível, não se se bem, não sei se mal, pois tem um ritmo calmo, quase parado, quase disperso, uma ar experimentalista, fotografia granulada que pretende parecer amadora, por vezes destoante (tem cenas em que os cortes mostram fotografias diferentes parecendo ter sido filmadas em cenários diferentes) deixando a questão se aquilo é um erro ou se tem algum propósito estético ou metafórico (como no filme Mary e Max), afinal está-se a falar de, senão duas terras, pelo menos dois estados de espírito.

E realmente não sei qual é mesmo a questão substancial do filme: se a penitência, se a ressurreição, se o poder regenerativo do amor, se “o que faria um outro eu na minha posição?”. Por isso digo, A Outra Terra é uma bela treta, uma banha de cobra, promete-nos algo, deixa-nos a babar por ele, e não tem a decência de no-lo dar, talvez por não saber como, talvez por nem estar aí para isso. 

1 de fevereiro de 2012

BLACK DYNAMITE, 2009

90% dos filmes americanos dos anos 60 e 70 têm uma caracterização, geralmente algum sufixo a preceder exploitation, eram sexploitation, zombieploitation, blaxploitation entre outros tantos vertentes. No entanto, os anos 60 e 70 provavelmente devem ter sido, de acordo com a minha limitada ciência da história do cinema, a ascensão do cinema negro, que nem sempre era realizado por negros, mas por brancos que forçavam os estereótipos, algo que provavelmente traumatizou alguns futuros realizadores como o Spike Lee que ainda hoje milita no cinema para limpar essa imagem e mesmo que faça filmes sobre bolachas propõe questões como: por que bolachas negras têm sempre chocolate? Mas politiquices à parte, o herói negro dos anos 70, quer dizer, o mais respeitado, era Sidney Portier, praticamente o único, mas depois da proliferação de blaxpoitation houve chuva de pretos no Hollywood, e, de uma maneira ou doutra, não obstante a esteriotipação, isso alavancou muito os negros no cinema.
Na minha terra o preto mais conhecido era o Jim Brown, era tão famoso que nem sabíamos quem era de maneira que qualquer herói preto era chamado de Jim Brown e levava muita gente ao cinema, aliás passei um terço da minha vida a chamar Carl Wethers  e Fred Williamson de Jim Brown, até o primeiro ter ganho estatuto próprio e passar a ser conhecido lá por Apolo (depois do filme Rocky, alguém se lembra? - que no entanto só praí nos finais dos 80 se tornou popular na minha terra).
Bem, basta de conversa desfiada, Black Dynamite hoje talvez não possa ser chamado de blaxploitation porquanto essa onda já parece ter passado (ou ficado apenas nos filmes pornos), por isso o que faz é reciclar filmes dos anos 70 e construir um filme tão mal feito como aqueles de tal maneira que a única coisa que pudesse daí resultar fosse um bom filme.
trailer

Black Dynamite é bom por ser mau. Eu explico: O herói é estereotipado ao extremo, aliás, não há um único personagem que não o seja; os actores são bons em representar mal, ou nem chegaram a precisar de representar, eu sei lá; o argumento é bom em ser mau, a história principal que começa o filme é de repente esquecida, o filme passa para outros ideais, mas de repente isso já não interessa nada, enfim… edição é boa em ser má, cortes estúpidos, transição de cena que desrespeitam totalmente o argumento; a fotografia má, a iluminação parecendo ter sido feita com uma lanterna de mão, cenas de luta ora levadas a sério, ora extrapolando o ridículo, onde o herói só precisa de sacudir as ancas para derrubar o oponente; carros que explodem no ar só porque despistaram; momentos risíveis abundantes (por exemplo, numa cena em que Black Dynamite fala com o irmão, contando-lhe a idade para se situar no tempo; ou que depois de explicar tudo o que a mãe lhe disse ainda assim tem um flash-back inútil a revelar esse momento); as one-liners são boas em não terem sentido; os diálogos são mais básicos que as conversas inteligentes das Tardes da Júlia; enfim, Black Dynamite tinha tudo de mau e tão mal feito que (tal e qual manda a lógica, a dupla negação é uma aceitação), repito, só podia ser um bom filme.
Um filme para ver com os amigos, dar umas boas risadas e passar hora e meia divertida e com o cérebro em off.

8 de janeiro de 2012

FEEBLES, OS TERRÍVEIS, 1989 (Meet The Feebles)

Peter Jackson nem sempre foi grande (quer dizer, em termos de reconhecimento hollywodiano) mas sempre manifestou o ideal de grandeza, o que se verifica nos pormenores com que constrói os seus filmes.

Meet The Feebles é uma sátira ao mundo do cinema, da televisão do teatro, na verdade não sei realmente qual, porque ao ter como o pano de fundo o palco e os bastidores, tanto podia ser de um como de outro, embora a trama principal esteja ligada à televisão. 

Meet... é um filme declaradamente de baixo orçamento, protagonizado por fantoches, marionetes, e pessoas vestidas com fantasias ridículas de animais, efeitos especiais beirando a amador, mas com uma direcção segura e capaz.  

A história do filme tanto podia ser esta: Robert, um bicho de campo chega à cidade com o sonho de ser actor, como provavelmente 90% das pessoas que mudam para Hollywood, e vai parar no set do The Feebles, e talvez por ser novo falta-lhe a arrogância e ainda não está tocado pela corrupção do mundo da representação; como ou podia esta outra: Bleech, um produtor ambicioso, com nariz para negócios, ilícitos ou não, que está metido tanto na droga como na pornografia, que filma nos bastidores; ou podia ser a história de Libby (que de alguma forma, não me perguntem por quê me lembra a Liz Taylor), uma hipopótamo com distúrbio alimentar e inclinação para a gordura, o que entra em contradição com a sua clausula contratual, mas do qual se livra por ser amante do produtor; ou de uma jornalista de revista cor-de-rosa sensacionalista, incarnada por uma mosca, que literalmente se afunda na merda para conseguir uma “boa” matéria; ou de outras tantas personagens, cada uma com os seus problemas e os seus tiques, que dentro do mesmo espaço, tornam o set numa paródia mórbida de um manicómio sem supervisão, transformando-o numa panela de imorais e amorais cujo único objectivo é dar-se bem na vida. Mas é claro que temos algumass personagens “puras” nesse meio, dos quais os restantes abusam da boa vontade.

trailer 

Meet The Feebles é um filme divertido e ácido, que ainda visita e parodia outros géneros, e é tão trash como os primeiros filmes de Peter Jackson. Para ver e dar umas risadas, e ainda desperta algumas interrogações sobre os negócios de bastidores. Apesar de ter bonecos, não é um filme para crianças considerando o seu tema e a forma como o foca.  Recomendável.

1 de agosto de 2011

MARTE PRECISA DE MÃES, 2011 (Mars Needs Moms)


Ainda estou para saber por que raio gosto de filmes que todos massacram. Marte Precisa de Mães, uma animação da Disney, foi o último filme que vi e quando fui ao IMDB, tinha uma pontuação bastante rasca, nem sequer chegava a mediano. Hum, isso assusta, sabem, pois leva-nos a pôr em questão a nossa capacidade de apreciação, perguntar: por que raio só eu gosto disto? Mas não, mas não, não se trata de mim, acho que Marte Precisa de Mães tocou alguns pontos que para os americanos é uma blasfémia, o que resultou num ataque de críticos que se espalhou para o mundo todo, aliás, sabe-se que os críticos do lado de cá não fazem mais nada do que concordar com os americanos, se eles dizem lá que um filme é bom, estes aqui secundam, o que explica que filmes como A Ressaca tenham sido muito bem falados quando talvez só tenham piada para a cultura americana.

Marte Precisa de Mães é um filme que diverte, com bastante fluência e que se consome rapidamente, e vou revê-lo com os meus sobrinhos para tirar a prova dos nove. Porém, o que vou fazer aqui é tentar perceber por que razão o filme foi maltratado apesar do seu tema, o que fará com que tenha spoilers.

Eis a história: Milo, um rapazinho, num daqueles momentos frequentes de ira que todas as crianças têm, diz à sua mãe que estaria melhor sem ela, e os marcianos que precisavam de mãe, uma boa mãe que saiba educar, e que por acaso estavam de olho na mãe dele, resolveram raptá-la para ir educar as suas crianças. E Milo seguiu a mãe e entrou na nave, indo acabar em Marte, onde conhece Gribbles, um humano que há vinte e cinco anos atrás vira a sua mãe a ser raptado e que desde essa altura viveu nas catacumbas de Marte. A entrar na aventura aparece Ki, uma marciana sorridente (linda e com um sorriso cativante, deixem-me dizer, apesar da sua feição marciana) por quem Gribbles acaba se apaixonando. Como vilã temos a Supervisora, uma espécie de amazona que resolve criar uma sociedade livre de homens, porque os gajos são preguiçosos e infantis.

trailer


Eis a história e ao mesmo tempo os problemas do filme, vou elencar o que desgostou a crítica americana:
  1. A relação entre Gribbles e Ki, visto um ser humano e outro marciano. Se a relação entre um preto e um branco, na América ainda hoje não é considerado uma relação normal, precisando do apodo interracial para poder entrar na categoria de relação, imaginem como eles reagem à uma relação inter-especiés. Não importa que Ki manifeste emoção, não importa que seja tão inteligente ou mais inteligente que Gribbles, não importa que ela seja, permitam-me dizer, um ser superior, não, o que conta é que ela não é humana, portanto isso é bestialidade. Aliás, nem importa que Gribbles se sinta mais marciano do que terrestre por ter passado a vida toda em Marte e com os marcianos, não, ele não é marciano. Tal como os árabes não são americanos, tenham ou não nascidos ali, os pretos também não, os latinos, os chineses, etc, o que justifica os prefixos afro-americano, sino-americano, entre outros. Nesse sentido, aceitar o filme, e não classificá-lo mal, seria aceitar a ideia de uma relação inter-especial, o que para eles é de muito mau gosto.

  2. A ideia de que nós, os homens masculinos, somos realmente preguiçosos. No Marte há dois mundo o de cima, onde vivem as mulheres, e o de baixo, a lixeira, onde vivem os homens, enquanto o de cima é bem desenvolvido, as mulheres falam, escrever, são inteligentes, o de baixo, onde vão parar os homens é bastante primitivo, os homens nem falar sabem, a única coisa que fazem é esfregarem-se um no outro, revelando sentimentos homo-afectivos (por favor não confundir com homossexual). Parece que o filme quer dizer que os homens só são salvos de não serem gays pela existência da mulher, e os americanos não querem ver isso, não querem saber que em cada ser humano há um gay que nos leva a fazer amizades fortes e duradouras com pessoas do mesmo sexo, o que nos leva a querer a precensa do amigo tal como queremos da namorada, sendo a relação sexual o único diferencial.

  3. Esse mundo dividido de Marte, onde a vilã, a supervisora, é consequentemente feminina, é também um ataque aos feministas, pois para não o ser, se o mundo fosse governado por mulheres, tinha de ser justo e imparcial. Nesse sentido, os politicamente correctos americanos tinham de atacar o filme (embora, não me pareça que este ponto seja o que realmente os preocupa, mas sim a sua masculinidade arranhada) usando isso como desculpa.

  4. Outra desculpa talvez seja a questão mãe. Milos define a mãe como uma empregada que nos ama. E eles não gostam dessa definição, acham que o conceito mãe vai mais longe, e que essa é uma ideia errada para passar às crianças. Porém, na verdade, o que é mãe, senão aquela empregada, que ainda por cima é patroa, pois dá-nos ordens, porém que nos ama e por quem temos amor. Que mãe se importa de ser empregada do seu filho, desde que este lhe diga todos os dias que a ama ou lhe mostra todos os dias esse amor? O que irrita os americanos é terem de reconhecer que sim, que eles usam mesmo a mãe como empregada, por ela ser mãe, mulher, o segundo da hierarquia familiar.

  5. A referência ao comunismo, o planeta vermelho e tal, e o constante ataque americano  a ele pelos americanos, feito por Gribbles, porque é um golpe no orgulho capitalista. Ou seja, o filme é uma inversão polar de Marte Ataca, visto que estamos tanto a observar a eles, como eles a nós, e pelo que parece a objectivo deles é mais cândido.


Enfim, o filme mostra várias coisas, talvez até mesmo uma apoligia ao cannabis, mostrando como os hippies davam cores à vida, mostrando como Marte ficou mais animado depois, sob o lema: O poder da flores, todo esse conjunto, deixa de ser um ensaio, para ser uma ofensa para as crianças, portanto, para fazer do Marte Precisa de Mães um mau filme. No entanto, se 60% de adultos não conseguem fazer do filme esta leitura que eu fiz, imaginem se 90 % de crianças conseguiriam. Portanto, a desculpa para massacrar o filme é para salvar o ego e justificar as fobias de uma determinada classe americana e não porque o filme não diverte ou não ensina. Confesso que eu também fiquei preocupado com a relação inter-especial, mas será essa a razão para negar todo o valor do filme.

Em termos técnicos, a animação é muito boa, foi usada a técnica de captura, tendo actores reais interpretado os personagens, ou seja, não houve apenas uma interpretação de voz. E houve bastante realismo nas cenas, e mesmo na história, considerando que se tomou em conta a questão de gravidade, ou a impossibilidade de respirar fora da cápsula, e se puderam os marcianos a respirar como os humanos compreende-se que foi para dinamizar a história. Porém, isso não tem nada a ver com a técnica. O filme é visualmente aparatoso, algumas renderizações têm um aspecto plástico, mas no geral está bem definido e é magnificado pela utilização da luz e cor.

Marte Precisa de Mães, não se enganem pela crítica, vejam pelos próprios olhos, é um filme bem divertido, com, pelo menos, uma personagem carismática, e que arranca umas boas gargalhadas. Porém, também é um filme que diz: Oh, Disney, quando quiseres fazer uma animação, não te esqueças de levar a Pixar junto.

20 de julho de 2011

X-MEN, O INÍCIO, 2011 (X-Men - First Class)


A minha veia nérdica levou-me a ver os filmes mais nerds que andam pelo cinema, e de todos escolhi um para falar, e procedendo a um processo de selecção, comecei por afastar o Transformer 3, por não ser propriamente instrutivo, mas diversão pura, resumindo-o em: De qualquer maneira Michael Bay sabe dar um espectáculo e a sua estereoscopia é a melhor que já vi, em termos perspectográfico, no cinema. Depois o Lanterna Verde (da DC COMICS) e o Thor (da MARVEL) que, superficiais e imberbes, não aquecem nem arrefecem, preferindo antes os seus respectivos desenhos: Lanterna Verde – O Primeiro Voo e Thor – Contos de Asgard, que serviram para introduzir o pessoal menos nerd ao universo fantástico destas personagens.

Escolhi falar de X-Men ­– O Ínicio, pois levou-me a ver de novo a série toda. E adianto desde já que é a melhor e mais consistente série de super-heróis no cinema, e o filme em causa é o melhor da série.

Não é preciso conhecer o universo de X-Men para gostar do filme, visto que os personagens foram bem introduzidos e os que têm um impacto substancial no desenvolvimento da história foram suficientemente bem caracterizados, tirando os coadjuvantes que estiveram ali mais para mostrar o fantástico desse mundo e a sua diversidade. Nesse sentido, conhecer o universo X-Men da BD, ou mesmo dos filmes anteriores, considerando que o reboot criou desfasamentos, apesar de pegarem na abertura do primeiro filme de série com o magneto no campo de concentração quando puto, para abrir este, pretendendo dizer com isso que houve uma continuidade cronológica, tal foi falso. Aliás, a cronologia dos três X-Men, do Wolverine, e deste não batem, nem entre si, nem com o universo do BD, mais uma razão para separá-los. Essa é a parte que os fãs odeiam, por exemplo (spoiler! Spoiler!) vermos aqui Darwin, o mais poderoso herói Marvel, com cabelo e a morrer às mãos do Rei Negro, ele que sobreviveu na BD à própria Hela (a deusa da morte), é um tanto irritante, mas separando os contextos, aceita-se, pois não se pode seguir tudo à risca considerando que são universos diferentes, o cinema e o papel.

trailer

Agora vamos ao filme em si. X-Men em qualquer universo, BD, cinema ou televisão, tem tido uma constante: a questão da diferença. Não é possível ver X-Men sem estabelecer parâmetros com as várias minorias da nossa sociedade e com a maneira como elas são tratadas. E quando tratamos mal a alguém não será justificável o seu ódio quando voltado contra nós?

Foi o que X-Men - O Início tenta mostrar. O vilão dos outros filmes, Magneto, aqui é mostrado de um ângulo menos parcial, quando ainda tentou acreditar na esperança de um mundo único, quando ainda estava disposto a morrer pela humanidade. Tirando Shaw, o Rei Negro, os restantes personagens, pelo menos os principais, não podem ser considerados nem imorais, nem amorais, mas simplesmente lidaram com uma escolha: seguir o princípio darwiniano da sobrevivência do mais forte, como a lição do Professor Xavier no início diz sobre os neandertais, ou acreditar numa utopia que vai contra as evidências. Nem se pode culpar ao Mutante, nem aos governantes que o levaram ao ponto onde ele chegou, porque se queremos sobreviver ao mais forte temos de lhe anular as vantagens. Mas isso quando a questão é vista num contexto de guerra. Por isso, o sonho de Xavier parece o mais equilibrado, não é preciso uma guerra, uma eliminação forçada, mas sim uma convivência pacífica, deixando a natureza seguir o seu curso. 

Não falei tanto e nem fui ao fundo como gostaria, , mas X-Men - O Início é um filme que agradará a todos, seja se forem em busca de aventura, seja de um filme sério, porque foi bem doseado e é perpassado por várias outras questões, como o do potencial que não desenvolvemos gastando a nossa energia em tentar encaixar em contextos mais cómodos, etc, e etc, aspecto que foi muito bem desenvolvido por Mística e Hank, e pela relação fugaz entre os dois, e também que explica a dedicação da Mística ao Magneto na primeira trilogia. 

É um filme que recomendo e, para mim, é claro, o melhor filme de super-heróis, sendo muito mais sério que a trilogia X-Men, e muito mais divertido que a primeira metade do primeiro Homem-Aranha de Sam Raimi (a metade boa).


P.S.: Alertado por Fernando Borges, que escreve Reflexão Geral, venho assim retractar, X-Men é o segundo melhor filme de super-heróis, Watchmen é o primeiro. 

15 de julho de 2011

TARTARUGA E A LEBRE, A - A REVANCHE DO SÉCULO, 2008 (Unstable Fables: Tortoise vs Hare)


Era uma vez uma lebre e uma tartaruga que se desafiaram para uma corrida. A lebre, muito rápida, em três tempos já estava perto da meta, deixando a tartaruga a comer poeira, porém, gabarolas como era, achou que ainda podia tirar uma soneca antes de acabar a prova. O resultado: ficou a dormir, enquanto a tartaruga, nos seus passos lentos, a ultrapassou, cortando a meta. Sim, basicamente é isto. A fábula é bem antiga e quem não a conhece deve ser da geração Toy Story, ou seja, viu mais desenhos de que leu livros ou ouviu contos.

Quando vi o título fiquei curioso, A Tartaruga e A Lebre - A Revanche do Século fiquei curioso, uma história tão simples e tão básica, que truques poderão torná-la interessante? Bem, e não é que não a fizeram interessante.

Eis a sinopse: 15 anos depois da famosa corrida, acontecimento que teve um destaque televisivo, a Lebre, ou devo dizer, o Sr. Lebre que ainda não conseguiu recuperar-se da trágica decisão de ter dormido no momento da corrida, e o Sr. Tartaruga, que ainda puxa lustro à sua vitória, ainda mantêm uma rivalidade constante, metendo toda a família ao barulho. E eis que há uma outra corrida na cidade e os dois resolvem participar com os seus filhos, o Sr. Lebre para dar a revida, o Sr. Tartaruga, para mostrar que o seu lema devagar e constante, com o qual ganhou a vida, continua a ser o mais indicado e que vai ridicularizar o vizinho… sim, os dois são vizinhos.

Ri-me o filme todo, situações engraçadas não faltaram. Tem umas piadas adultas que, no entanto, são bastante inocentes, nada como a erecção de Lorde Farquuad ao ver a imagem de Fiona no filme de Shrek.

trailer

Ainda aproveita para ensinar que a dança é o remédio para o mal do mundo. Não é para ser tomado à letra, mas a verdade é que o mote é: faz amor e não a guerra, um tanto hippie, porém real. Os conflitos nascem da competição. Não sou contra a competição, no entanto, a maior parte é supérflua e alteia mais barreiras do que as derruba; por exemplo, a competição para ser o mais rico do mundo, resulta em empobrecer milhares para chegar a esse ponto. Os vizinhos competem, os países competem, irmãos competem entre si, quando se se unissem mais facilmente chegariam a um objectivo que pudesse satisfazer a ambos e manter o clima de dança. Houve um momento no filme que se ouve uma frase como esta: bomba neste país. A frase, casual e deslocada, mostra no entanto o descontentamento e o cepticismo em relação à melhoria deste planeta e a unidade e harmonia. Hum… o meu texto está muito animado e com uma, sei lá, ingenuidade utópica marcante, e devo isso ao filme, mérito dele.

Ainda temos referências ao mundo televisivo, aos cameramens que filmam desgraças sem ajudar, como se fossem documentaristas da National Geographic, dos paparazzos, e da incidência da média na vida privada que eleva à catastrófica um simples problema de uma figura pública. Algumas piadas ácidas e situações que remetem para o estado actual da coisas,  não entendíveis pelos mais desatentos, porém que fazem a boa graça do filme.

Quanto à parte técnica, A Tartaruga e A Lebre, tem uma animação é bem fluída, mas a modelação parece bem tosca, dando a entender que os produtores não tinham muito dinheiro (bem, também o filme foi direito para o vídeo), pois pareciam mais bonecos de plasticina do que modelos computorizados. Gostei bastante do filme e é bem divertido, faz rir e aguenta bem os seus setenta minutos. Um bom filme para ver com as crianças.