18 de maio de 2021

HOSSANA AO FILHO DE DAVID - O BRANCO REDENTOR VOLTOU

Quando Jesus chegou a Jerusalém, as pessoas... peraaaa!, filme errado.


Quando o Marcelo Ribelo?... Ribeiro?... Aiiiii.... Quando Marcelo R. Sousa chegou à Guiné-Bissau, com muito orgulho fomos mostrar porque aquele país continua na merda e o quão desocupados somos. Fomos buscá-lo ao aeroporto e enchemos as ruas com cartazes para o receber, pois afinal, já que os quatro aviões árabes não chegam com o bilião de dolares, vamos ver se o Marcelo tem algumas moedas de dois aeoros para dispensar.

Alguém se lembra de como os portugueses encheram o aeroporto com grupos de mandjuandade e se alinharam nas ruas para receber o Sissoco quando ele veio passear a Portugal?... Alguém?... Alguém?... Ninguém?... Eeeeepá!

Até mesmo os mais ferrenhos apoiantes guineenses do Sissocó que vivem em Lisboa não o foram buscar ao aeroporto, porque tinham de ir, usando as palavras de alguém, entregar o pau-do-corpo ao patrão branco. Estavam ocupados e além do mais, Sissoco não é a Seleção-Portuguesa-Depois-de-uma-Vitória-Importante e nem é o Papa, que são duas figuras que movimentam fanáticos.

Mas nós, guineenses, adoramos toca-palmices, estamos sempre prontos para bater palmas a quem o chefe mandar, sem posição crítica. Sei de pessoas no governo atual com, aparentemente, muito senso crítico sobre o domínio europeu e que acharia essa recepção do Marcelo um culambismo ao homem branco, e uma submissão colonizante, mas que por conta de politiquices e chuchices nem se manifestaram. E ainda admiramos que fomos colonizados e que estamos colonizados.

Já agora um vídeo sobre como recebemos também o pai do Marcelo, que era o Ministro das Colónias, quando chegou à Guiné e façamos as contas. Qualquer semelhança com o ontem não é mera coincidência.


A propósito, acham que o Marcelo foi à Guiné porque gosta dos guineenses ou apenas para reforçar a influência de Portugal e tentar com que o Macron não nos roube dele com os seus aeoros que bondosamente prometeu aos países africanos?

(para quem tiver tempo de sobra, um artigo: http://montedepalavras.blogspot.com/.../lideres-os...)

5 de maio de 2021

A MÚSICA TAMBÉM PODE SER PROBLEMA

Buba. 2019. 1 de Maio. Praia. Um grupo de jovens sentados, a beber e a conversar, outros a dançar. De repente a música "larga nha kodjon" e os que estavam sentados, rapazes e raparigas, gritaram todos: uaaaaaaaa, e lá se meteram a dançar e a cantar com a música, todos, até crianças.

Bissau. 2021. Abril. Cuntum. Tocava música lá fora. De repente: "Bo rastam, bo lebam..." e ouvi: uaaaaaaaa, e toda a gente a cantar e, suponho, a dançar. A música é fixe, dou-lhe isso, mas a letra é horrível. Claramente escrito por um homem.

Há meses que tenho visto a campanha "Mindjer i ka Tambur" a tentar sensibilizar as pessoas para assuntos de violência contra as mulheres. Lidamos constantemente com violências do tipo que a música invoca, onde mulheres são arrastadas e a suas perucas lhes são retiradas e ela são violadas, tratadas como carne e não pessoas. Essa música reforça a prática.

Se fosse uma mulher a escrever e a cantar a música... bem, continuaria a ser problemático, mas menos... sabem?, a cada uma a sua preferência sexual.

É assim, já me disseram, é só uma música, é brincadeira. Não, não é brincadeira. Não digo que a intenção consciente do autor seja apelar à violação, mas é isso que a música faz.

As piadas, os estereótipos, entre outros ditos problemáticos reforçam as ideias, porque nunca pensamos que são perigosos até que se tornam. É como um bebé que quando insulta os outros nos rimos da sua inocência, até que nos insulta a nós e já não achamos graça e depois notamos que ele ao crescer normalizou o insulto e depois fica difícil corrigi-lo. Kana seku...

Não brinquemos com a violência, ou com coisas que destroem a vida de outras pessoas, ou com coisas que diariamente causam vítimas.

WJ numa música, "Nha Carta", romantiza a violência, diz que bate na sua fofa, dá-lhe rasteiradas e deixa-a fungulida. Isso não é amor, é só violência e sentimento de posse.

Maio Copé canta: "kusta n' bafa mindjer, ma n' ten di toma noiba". Não, se bafares uma mulher é para seres preso, não é para casares com a pessoa que violaste. Ahdeuss! Então é assim? Isso reduz a mulher a um objeto conquistável enfiando-se nele o pénis.

Vi mulheres a dançar e a cantar "bo rastam, bo lebam", e pensei se não deviam ficar preocupadas, falei com uma amiga e ela respondeu: "não é sobre mim". É verdade, não era sobre ela.

Lembro-me de uma música de Tino Trimó que dizia "si dinheru sta ba na po, mindjeris na kasa ku santchu", ideia que é ainda veiculada na Guiné. Até o meu irmão mais novo de 20 anos que não tope nem "koko na kadera" (não tenho problemas com palavrões), também diz que as raparigas de Bissau só querem dinheiro. E ele tem muitas namoradas e nenhum dinheiro. Se as mulheres só quisessem dinheiro, mais de 80% dos guineenses seriam virgens. E os jovens então, uiiiiiiii... Na altura dessa música do Tino, lembro-me de uma tia responder, quando alguém perguntou por que as mulheres gostavam do Tino se ele falava mal delas: "Ele canta bem [e canta e como!] e é sobre outras mulheres, eu não sou assim".

É sempre sobre outras mulheres, mas quando o estereótipo pega, nenhuma mulher fica de fora, e quando o mal se espalha, todas as mulheres sofrem, e com elas a sociedade.

Ussumane Grifom escreveu um artigo sobre este tema de músicas problemáticas e relacionou a causa com a falta da educação formal (escolas). Eis a coisa, precisamos de nos reeducarmos formal e informalmente, e discutirmos cada vez mais estes assuntos.