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16 de maio de 2022

CARO AMIGO POLIAMORISTA (DA ETICIZAÇÃO)

Caro amigo poliamorista,

Espero que esta missiva te encontre de boa com a vida e na crista da onda, onde andas como especialista a fazer revista na tua boa lista de poliamoristas e outras em vista de te fazerem festinhas. A sério desejo mesmo que não estejas num ermo, a sentires-te enfermo, mas a curtir amores em cheio com o sucesso de envolvimentos plenos.

Caro amigo poliamorista, nós, seres humanos, somos todos falhos e metemo-nos em trabalhos, porque nunca queremos as mesmas coisas, cada um de nós poisa os seus ideais nas suas próprias notas, e é por isso que todos criamos regras e guias para as nossas vidas ou escolhemos seguir as linhas que o nosso indica como onde se respira mais sentido nesta via. Todavia, se algumas dessas regras parecem menos cegas ou são mesmo menos bestas que outras, não significa que não possam ser escrotas ou que sejam perfeitas e feitas para além da crítica. Cri e vi cá que o poliamorismo pode ser boa prática, sendo genérico, é certo; mas lá porque dizemos, às vezes histéricos, que o poliamorismo é "consentimento ético", não quer dizer que seja assim mesmo, e nem que o "consentimento ético" seja um exclusivo do poliamorismo.

É muito comum, sem freio nenhum, ver-te a chamar aos "monogâmicos" de traidores, quase como se fossem seres inferiores, que não sabem gerir os ciúmes e as dores e os ardores. E para provar quão errados são os monogâmicos, dizes que a monogamia é uma fantasia, uma construção social, logo está mal por não ser natural. Também dizes que a monogamia é da autoria do capitalismo, mas... hey... a monogamia é bem anterior ao capitalismo, pelo menos o capitalismo formal que conhecemos hoje, do qual até o diabo foge tomado de medo, e ao qual todos apontamos o dedo. E, caro amigo, o capitalismo também usa o poliamorismo, usa as não-monogamias e com todas as mordomias usa qualquer movimento capaz de aglutinamentos... o capitalismo não descura nichos, dá e tira com capricho e trata a todos como bichos.

Enfim... dizes assim e com tanta certeza: "Os animais na natureza não são monogâmicos, logo o ser humano não é feito para ser monogâmico." Bem concordo contigo, caro amigo, quando dizes que os animais não são monogâmicos...mas nem são poligâmicos... muito menos poliamoristas... todavia há espécies que só têm um parceiro e há os porreiros que não precisam de sequer do sexo e reproduzem por si e consigo mesmos, mostrando que a função do sexo talvez não seja meramente...Atenção, não estou com essa menção a dizer que a copulação serve só para reprodução, aliás nem define a reprodução, uma vez que, como acabei de dizer, há espécies que reproduzem sem foder... Largando este papo para outro espaço vou retomando: nem o ser humano é monogâmico ou poligâmico ou poliamorista, ele pode praticar tudo isso da lista, mas como espécie não o caracteriza. O ser humano não é um ser orientado apenas pelas básicas lógicas biológicas, mas faz as suas próprias, psicológicas e sociológicas. Destarte reduzir o ser humano a apenas uma camada: a animal, é negar que o pensamento e a organização social fazem parte da nossa evolução e nos ajuda com resoluções, e que foi o que nos ajudou a sobreviver a sérios novelos de desvelos, e paradoxalmente, a criar o antropoceno.

Nós deixamos de ser meramente "natural", quando começamos a criar, é só observar. Usamos óculos para melhorar os olhos, fones para ouvir melhor, adoçantes para o sabor, pacemaker para fazer bater o coração, e injeção e inoculação e vacinas para estender a vida, resistindo mais às adversidades biológicas. Transformamos e transformamos. Por exemplo, os dentes que que antes arreganhávamos para assustarmos os outros, hoje com novos modos arreganhamo-los como engodos, em sorrisos rasgados, para criar contactos. Ou por exemplo, hoje falamos tanto mesmo do problemático que é a masculinidade tóxica, da qual a gente não se quer próxima, filha da cultura do macho-alfa, e da qual se quer dar um basta, mas a natureza está cheia de exemplos de machos-alfa, o que, todavia, não nos faz falta, razão pela qual a ideia não se salva, pois não queremos descer a escarpa a louvar a cultura alfa. Em resumo: somos também construtos sociais e não mais apenas animais tintos com instintos não distintos.

Repito e remarco, a monogamia é tanto uma construção social quanto as não-monogamias. E de forma fria, também o amor é uma construção social, porque a noção do amor ou da sua demonstração também varia de sociedade para sociedade e é apreendido socialmente... Mas lá porque algo é uma construção social, não significa que seja do mal. "Não matarás! Não roubarás! Não foderás o teu vizinho... a não ser que ele peça com carinho!", são construções sociais, mas ajudam a sociedade a funcionar de forma mais capaz. 

Entendes caro amigo?, não obstante ser difundido como padrão e destruído formas de relação e de ligação, o conceito da monogamia não é problema por si mesmo e nem devia. Só quando os seus cônegos e crentes gastam fôlego e tempo e agem de modo cego a atacar as outras formas de relação, aí sim, entra a questão da problematização.

Hoje a monogamia é norma (regra, entenda-se)... as normas podem ajudar até deixarem de fazer sentido, até serem casos perdidos, ou começarem a causar mais mal do que bem, mas todos vivemos com normas, tanto que às vezes a forma como comportas com a questão do poliamor parece que não queres dar respostas, mas substituir uma norma pela outra, que ainda não tem a mesma expressão política e expressão opressora. Sim, falo de substituição e de opressão e não de alteridade, porque da forma como te vejo a policiar a poliamoridade parece-me que não queres deixar espaços para a liberdade de amar, embora seja o que andas a advogar. Caro amigo poliamorista, ama, deixa amar, deixe-se amar, sinta o amor, lambe-lhe a cor, toque-lhe o odor, olha o seu som, cheira-lhe a textura, sem gráficos complicados a qualificar os envolvimentos... aliás, não é o que pedimos aos monogamistas?

Caro amigo poliamorista, falas tanto do "consentimento etico", mas há muitas formas de relacionamentos que são éticas, como já tinha dito, e não é só o poliamorismo. A monogamia pode ser ética, a poligamia também pode ser ética, embora esteja a sua mais comum forma, a poliginia, fundamentada no poder macho (atemo-nos ao mundo humano, para evitar a cena dos alfas, embora o que não nos falta seja animalidade).

Sobre o consentimento ético, na Guiné-Bissau, a título de exemplo, é bastante comum a poliginia... o contrário não se verifica... todavia, apesar disso muitas vezes são questões acordadas, muitas vezes propostadas pela mulher, porque precisa de ajuda nos campos e na casa e no poço e nos trabalhos e nos trampos diários e no etecétera, enquanto o marido se senta o dia todo sozinho a sacudir moscas com um rabo de vaca ou a coçar os testículos numa outra tabanca. Claro que as suas circunstâncias é que as levam a isso, e se conhecessem ou vivessem noutra realidade, quereriam outra coisa com maior equidade. Apesar de tudo, algumas, dentro dessa sua prisão e da sua limitação, escolhem e consentem.

Anos antes do capitalismo pintar as sociedades guineenses, a poligamia (poliginia) já existia, e em uma dessas sociedades fala-se da existência outrora da poliandria, mas da qual nem sombra se vê hoje em dia, provavelmente resultado das evangelizações ou de outras razões. Quanto às sociedades poligínicas, o número das esposas dependia dos posses do homem, quanto mais campos e mais gados, mais esposas e mais filhos (mãos de obra). O capitalismo ainda não tinha ali chegado, a economia era centrada no sector primário e configurava e influenciava as relações ditas amorosas. Hoje ainda é a mesma coisa em todo o mundo, porque no fundo só a economia mudou, a relação do poder continuou.

Falei disto para dizer que nem a monogamia nem a poligamia são frutos imediatos do capitalismo, ou pelo menos do capitalismo formal moderno, embora, sim, sejam usados pelo capitalismo (tal e qual o poliamoriasmo). Há uma sociedade guineense que é poligínica, mas que tem mecanismos para a mulher vazar as suas frustrações com outro indivíduo masculino que lhe seja querido, não precisa do consentimento do marido, o marido pode até sentir-se traído, mas não há castigo, não há punição. E essa noção é a razão por que pode haver "consentimento" na "traição". E a chamada "traição", se calhar, não é de todo não-ético. Pessoas dormem com outras e "traem" por diferentes razões a que razão pode conhecer ou talvez não; algumas traições são necessárias pelas suas próprias razões, pode ser por sobrevivência mental ou material ou emocional ou social ou seja qual for, é preciso sempre contextualizar... a não ser que a ideia da ética seja mesmo uma forma de dogma. "Não matarás" é ético com certeza... mas... e se for em legítima defesa?

Caro amigo poliamorista, tenha isto em perspetiva, não somos e nem percebemos mais ou melhor do amor do que monoamoristas, só por sermos ou por nos dizermos poliamoristas, apenas temos um diferente entendimento. Aliás o poliamorismo pode ser tão tóxico quanto o monogamismo, porque a questão, caro amigo, não é a prática, mas quem a pratica e a forma como a ela se dedica.

Sob a capa do poliamorismo, também abrimos abismos e também temos predadores sexuais, stalkers (reais e virtuais); também passio-dependentes que usam outras gentes para a satisfação pungente dos seus vícios; 
temos visto gente com medo de compromisso que por isso transita entre corações sofridos para se abster de se comprometer com alguém, magoando antes com medo do distante; temos machos a defender a política de pénis único, com argumentos túrgidos, ciumentos como tudo, a controlar e a abusar de mulheres;  temos pessoas traumatizadas a traumatizar outras almas; temos pessoas mentirosas, traidoras e manipuladoras; temos pessoas em dezenas de relações (superficiais) sem a consideração que o amor e a afeição exigem tempo e cuidado, e que o nosso coração pode ser uma imensidão, mas o nosso tempo não (não sei o que é o amor, mas sei o que para mim não é amor); temos pessoas a usarem a questão das relações como se de uma religião se tratasse, como se de um produto se tratasse, capitalizando dela, virando gurus de tudo e mais alguma coisas e manipulando almas confusas que abismos cruzam... enfim, resumo, por não poder elencar tudo, pode te parecer absurdo, repito, mas não é sobre a prática em si, mas sobre quem a pratica. E ser poliamorista não é ser anticapitalista, é só ser poliamorista.

Usar o poliamor como uma bandeira política é parte da vida, quando uma escolha consentida e objetiva. Mas quando o poliamorismo se revolve num ativismo extremo, que quer roubar os remos e que vemos a chamar a todos os monogâmicos de cegos, de imbecis e de carneirada afogada na traição e na ilusão, que não faz mais senão traição (como se a limitação da traição seja sexual ou como se a traição seja um exclusivo do monoamorismo), aí fica difícil acreditar que o teu poliamorismo não seja só clubismo. Até entendo que recém-convertidos ao poliamorismo sejam irritantes, porque como parece que descobriram uma novas verdades,  mas antes distantes, 
sentem-se arrogantes e tornam-se mais chatos que um recém-vegano ou um recém-ateu iniciado. Mas mais chato mesmo é um récem-ateu e recém-vegano recém-convertido ao poliamorismo. Por isso, há quem te supere, caro amigo.

Caro amigo poliamorista, o consentimento, esse vem em diferentes pacotes, com diversas texturas e diversos sabores e diversos toques e diversos odores, e, olha lá, embora se creia universal, a ética, se calhar, depende de contextos. Mas o que é certo certo certo certo mesmo é que o poliamor tem tanto peso e tanto problema quanto o monoamor, não fosse o poliamor uma prática desenvolvida por seres não perfeitos e tão insatisfeitos e inquietos como os humanos. Por isso, meu caro, às vezes, o mais claro é relaxarmos apenas, aliviar as penas, abrir as pernas (ou outras cenas) e vivermos a nossa verdade, protegendo-a, é claro, de ataques bárbaros, mas sem andarmos despertos e soberbos a emular os atacantes num jogo fedorento e, com asco, nos colocando no lugar do carrasco. 

A não-monogamia não é por si só ética. Ponto.




25 de abril de 2021

DIÁRIO DE UM ETNÓLOGO GUINEENSE NA EUROPA (dia 7)

25 de Abril – a revolução d’escravos

 

Todos os anos, mas todos os anos, no 25 de Abril, os tugas entram na rua para comemorar a Revolução d’Escravos, mas coitados, acho-os tão confusos que nem entendem as suas próprias datas.

É assim, os tugas disseram que o 25 de Abril de 1974, foi o dia da Revolução d’Escravos, que os capitães do Abril foram tomar o poder lá na Grândola da Vila Morena, porque o povo ordena. Na verdade, o povo nada ordena, o povo é ordenado, porque os tugas não conseguem fazer nada por si mesmos, precisam sempre e têm mania de capitães, os quais adoram e até lhes fazem estátuas. Quando chegaram ao Brasil tinham um capitão, à Guiné, outro capitão, ao Moçambique, mais um capitão, e na Madeira é o Cristão Ronaldo o capitão.

Os tugas dizem: 25 de Abril de 1974 é a revolução que trouxe a democracia para o país, e é aí que eu fico confuso… mas então e o PREC?, e o Verão Quente?, e o 25 de Novembro de 1975?

Vou explicar tintins por tintins.

O PREC era um ogroooooo… hmmmm, desculpa, esse era o Shrek.

Quando no 25 de Abril se fez o primeiro golpe de estado… desculpa, revolução, golpe de estado é coisa de terceiro mundo… a revolução fez instalar no poder um bando de comunistas que diziam: “o povo é que mais ordena, portanto vamos tirar dos ricos e distribuir aos pobres”. Os ricos disseram: “calma aí, que história é esse de PREC pra aqui e PREC praí, o povo que vá ordenar lá no seu quintal e não entrem nas nossas propriedades que herdamos honestamente com a ajuda da ex-monarquia e do Santo António Salazar”. E a Igreja disse: “os únicos Antónios que reconhecemos como santos é o Santo António Vieira dos meninos índios, o Santo António do menino Jesus, e o Santo António Salazar… quanto ao António Spínola, já vamos ver, se ele se converter, santificamo-lo.” Claro que o Spínola se converteu, pois a coisa não fluía como ele queria, e ele intentou um novo golpe contra o primeiro que tinha dado... uma revolução em Março de 1975, que não correu bem.

O tio Paulo Bano Bajanca disse-me que os Capitães de Abril na verdade estavam mais preocupados com a sua própria vida, a sua posição (estava-se a criar demasiados capitães) e o problema de salário, e que foi isso que motivou o golpe (mas avisou-me para que não dissesse isso em voz alta em público, porque hoje os capitães são sagrados e algum jihadista tuga poderá atacar-me).

O tio Paulo Bano ainda disse que os capitães de Abril estavam na Guiné, no Moçambique e em Angola (a sua maior parte na Guiné, onde começou tudo), e os que eles chamam turras estavam a complicar-lhes a vida seriamente e a anular-lhes a vantagem tática militar, e eles começaram a questionar a "sustentabilidade" da Guerra. Se estivessem a ganhar a guerra, continuariam a ser capitães de todos os meses, mas lá nas áfricas. E enquanto eram apenas os soldados limpa-pias, miúdos brancos pobres e os pretos pobres alistados, que morriam, não havia problema, dava para continuar a ser capitão, mas quando milicianos alegadamente começaram a ser nomeados capitães, a coisa começou a feder, os que viriam a ser os de Abril disseram: “Então, pá, que história é esta, pá, estão a estragar a classe, pá!”, e depois quando não lhes quiseram dar salários mais chorudos eles disseram: “Foda-se, Marmelo Rebel… Marcelo Catana, pá, estás a cortar em tudo, pá, pensas que és o Caço Coelhos ou quê, pá? Mau, mau, menino. Vamos dar-te um golpinho, pá, ai, vamos. Não sabes que não se deve meter com os militares e com os ricos, pá, ou queres levar com uma revoluçãozinha, pá?” O Marcelo Catana, padrinho do nosso Marmelo Rebelde, como não estava atento, foi ele mesmo cortado, pumba, toma, 25 de Abril. Meteram-se com os militares, golpe de estado, queriam o quê?

Mas aí é que está a cena, não era nenhuma Revolução d’ Escravos, mas da burguesia militar ... alguma vez soldados limpa-pias fizeram golpe? Hmmmmm! O golpe depois foi sequestrado pela burguesia civil. O Zé Povinho tem lá tempo para revolucionar, ele continua escravo.

Mas é verdade que havia bons capitães, com ideais mais nobres e mais sociais do que a mera questão do salário e da classe. Até havia capitães comunistas que queriam abolir mesmo a classe. E esses juntaram-se lá com os comunistas e começaram a tomar tudo dos ricos e os grandes donos do dinheiro, amigos do Santo Salazar, bazaram para o Brasil, outros converteram-se imediatamente ao comunismo, para escapar à inquisição e começaram a gritar: “Viva a revolução! Viva a revolução!”.

Então os gajos dos PREC disseram-lhes, “uiiii, ainda bem que concordam, precisamos das vossas terras e dos vossos prédios por causa dos retornados que estão a chegar em catadupa. E queremos criar sindicatos para que possam receber melhores salários e não serem assim tão explorados!”. Os gajos do PREC ainda disseram “ouve lá, tipo a nossa cena é muita cool e tipo muita alternativo, tipo meio hippie, meio yuppie, meio hipster, tipo, sabem, tipo não queremos um socialismo tipo CCCP (Cuidado Com os Camaradas do Partido), nem uma cena tipo capitalista, mas, tipo, vamos fazer um socialismo tipo democrático, tipo o de Bernie Sandes, aliás, tipo, não se esqueçam que tipo até fizemos eleições já!".

Então os ricos recém-convertidos, disseram: “Porra, pá, a revolução é bem-vinda, pá, mas que fique longe das nossas posses, pá. Estão a dar as nossas coisas aos retornados, pá, e eles, pá, nem são portugueses de verdade, pá! Fechem as fronteiras, pá, eles que voltem para as suas terras, pá. Precisamos de uma nova revolução, pá".

Então apareceu o Super Mário Só Ares, como salvador dos ricos (ele mesmo, como o Marmelo Rebelde de Sousa, filho de um antigo ministro das colónias), criou uma fundação que foi financiada pelos americanos da TIA que tinham vindo cá passar um Verão Quente em 1975, com barcos e tudo (o que inspirou o Paulo Tortas a comprar submarinos e o Sócrático a ir passar o verão em França, financiado pela MÃE), e pumba, toma, 25 de Novembro. Meteram-se com os ricos, revoluçãozinha, queriam o quê?


(Os tugas e o 25, meu!, desde que Jesus começou essa moda em dezembro, pegou seriamente)!

Com o 25 de Novembro de 1975, ano e meio depois do 25 de Abril de 1974, a segunda revolução, correram com os comunistas do poder, estes ficaram nos sindicatos. Disseram que os comunistas estavam a comunistar o país e que iriam torná-lo numa Correia do Norte ou numa Venezuela de Está Ali Né (ou Esta Aline, o tio Paulo Bano não sabe como se pronuncia), e que isso não era democrático, pois os comunistas começariam a comer criancinhas (isto já foi a Igreja preocupada com a concorrência). O democrático é deixar os ricos manterem as suas posses e os pobres, o proletariado e os retornados que se fodam, afinal por que não escolheram nascer em bons berços, ou por que fizeram um pé-de-meia em vez de bolsos fundos protegidos pelo Estado? A Igreja, os Espíritos Santos, os Chupalimões, os Souteu Mayor, entre outros, recuperam os seus poderes e a sua influência e continuaram na berra, a lixar o povo desde então.

Eis a razão porque não entendo essa história de que o 25 de Abril foi a revolução que trouxe a democracia, pois pelo visto, ele iria trazer mas sim o comunismo do Esta Aline. Sendo assim, logo foi o 25 de Novembro que trouxe a democracia. O 25 de Abril ainda falou do povo, mas os que ficaram com o poder depois do 25 do novembro, só falaram do dinheiro.

Imaginem que em 2021, hoje, chegasse uma massa de portugueses como a quantidade dos retornados que veio depois do 25 de Abril, sem os comunistas e os esquerdalhas para os acolher, morreriam todos afogados no mediterrâneo.

Se a revolução do 25 de Abril foi contrarevolucionada pelo 25 de Novembro, porque se fala ainda do 25 de Abril?

Se o 25 de Abril foi a Revolução d’ Escravos (o que duvido muito), e é representado pelos cravos, o 25 de Novembro é então a Revolução dos Donos d’ Escravos, representado pelo algodão(?). Ahhhhh, agora entendi, o primeiro soa melhor e é mais publicitável. Por isso foi sequestrado pelos contrarevolucionários capitalistas.

Agora andam por aí a dizer que o 25 de Abril foi para libertar as colónias, ui, que nobreza, e para acabar com os escravos e outras cenas de opressão, mas como escreve aí um amigo de um conterrâneo meu, chamado Apolo do Caralho:

"Se por revolução se intende 'rotura radical', em que medida um acontecimento pode assim ser chamado se mantém tantas coisas do passado como por exemplo um hino e uma bandeira erguendo inclusive, esses símbolos, à qualidade de 'dogmas' constitucionais que ninguém pode contestar sob pena de punição? (...) Se por revolução entendemos momento de acertar as contas e construir novos pactos, porque razão os criminosos de guerra não foram julgados? Se entendemos que uma verdadeira revolução só o povo pode fazer, só ele é autor, porque razão tantos títulos de 'heróis' são atribuídos a militares tão só?"

Se Spínola tentou um golpe contra o golpe que lhe deu fama, e se houve outro golpe que golpeou o golpe de Spínola, por que ele é visto com um revolucionário e herói português?

 

Ai que confusão! Vou colocar a cabeça em gelo e escrever um pedido de desculpa formal aos jihadistas nacionalistas portugueses.


29 de maio de 2020

WAKA-QUÊ? - BLACK PANTHER (uma treta de representatividade)

Resisti imenso a falar aqui sobre o filme Black Panther… o ficcional. Mas alguém ter citado Wakanda por conta do que se está a passar hoje nos EUA levou-me a escrever. Quando o capitalismo se apossa das causas sociais, temos isto.

O filme, apesar da estética e do formalismo maravilhoso, é narrativamente bastante fraco, um filme onde o vilão consegue ser mais consistente e mais sólido que o herói. Mas tirando todas as falhas do conceito e da execução do filme, o marketing do mesmo foi genial.

Black Panther foi vendido como um filme negro, um filme para negros, um filme afro-futurista(?), e o marketing foi tão bem feito com ajuda dos próprios movimentos negros e o filme ganhou o hype que ganhou (e o dinheiro que ganhou). Mas na verdade Black Panther é um filme tão negro-representativo como Wonder Woman é um filme feminista, aliás, eu já vi filmes pornos mais feministas que Wonder Woman.

Voltando ao Black Panther, o que faltou na análise é que a história do filme não representa sequer a África ou os negros. Black Panther é a história de privilegiados que querem manter os seus privilégios. Wakanda é todo futurista, assim como Nova Iorque é cheia de prédios, mas como vivem as pessoas, como vivem os pobres? Por que é preciso um sistema monárquico e todo à la Rei Leão (inclusive com o herói a ter visão do pai)? Por que é preciso um sistema de força onde machos-alfas lutam pela coroa? Por que o herói que perdeu a luta, dentro das leis locais, volta para cometer um golpe de estado? Por que o vilão que é mais coerente e que só quer liberdade para o seu povo teve a sua filosofia distorcida, tornando-o um genocida? Há mais coisas.

Para simplificar a leitura, mostro alguns problemas da representação do filme que mostra com ele é bem branco e panfletariamente americana:

1. Dentro de Wakanda, uma sociedade ultra-desenvolvida, a questão da liderança é resolvida à força através de lutas tribais.

2. A tribo "Jabari" que não quer a tecnologia é representada como "primitiva", nem veste roupas, anda o tempo todo pintado e quando aparece fica a ulular.

3. A CIA que foi inimiga dos Black Panthers reais é representada no filme como amigo, e até Wakanda que é fechada à restante África foi aberta ao amigo branco da CIA.

4. O príncipe acha que agora Wakanda vai abrir-se para o mundo, então a primeira coisa que faz foi ir para os Estados Unidos abrir um centro qualquer, em vez de fazer acordos com os países africanos que sofrem da opressão do capitalismo.


Black Panther é um filme com atores negros, trabalhadores negros, mas, não é um filme sobre negros ou sobre a luta dos negros, aliás a única pessoa que representa a luta dos negros é o vilão (entendem a relação?). E no final do dia, com todos os negros a comprarem bilhetes, brinquedos, camisolas e merchandises de Black Phanter (ou mulheres, no caso de Wonder Woman), quem fica ainda muito mais rico no final do dia são os donos dos estúdios americanos, homens brancos e ricos como os Harvey Weinstein.

Africanistas a dizer Wakanda Forever… pelamordideus, basta de masturbação. Voltem para a realidade. Resumo: se não desenharmos nós mesmos as nossas lutas, fora dos sistemas controladores, vamos continuar a wakandar forever enquanto a situação continua a mesma.

Ah, a propósito, a cena de cruzar o braços em X é muito mais antiga do que Black Panther.


3 de novembro de 2018

TEM BONS DENTES?... NÃO? ENTÃO FORA…

Theresa May disse que depois de efetivar o Brexit vai passar a ser o Reino Unido a escolher e a decidir quem entra no território e só vão ser “pessoas qualificadas”.

Nem o tema, nem o processo são estranhos. Durante o comércio de escravos também só eram levadas as “pessoas qualificadas” para a Europa (ou América), pois elas trabalham e geram riquezas (a condição do trabalho não importa aqui, desde que elas trabalhem). E a questão não se encontra circunscrita ao Reino Unido, mas é toda uma postura da Europa. Recentemente, durante a crise de refugiados, fartamo-nos de ouvir e ver argumentos iguais por tudo o que é lado.

O coordenador do Observatório da Emigração disse que Portugal precisa urgentemente de imigrantes para resolver o problema da falta de mão de obra. A política de imigração de Merkel foi de facilitar a entrada de pessoas “educadas” na Alemanha. Macron há pouco tempo deu documentos a um herói escalador de paredes… enfim…

Cá em Portugal, os do “contra-imigrantes” dizem: “esses PRETOS (como se os imigrantes fossem só pretos, os do norte europeu são bem-vindos, ó, expatriados) só vêm cá para viver da segurança social e dos nossos impostos e não querem trabalhar um corno”. E os “pró-emigrantes”, da esquerda, dizem: “os né... os AFRICANOS são gente produtiva que trabalha bastante para sustentar a família, por isso devemos abrir-lhes as portas, pois eles são comprometidos com o trabalho e nem todos são maus”.

Pois, claro que não, nem todos são maus, alguns têm bons dentes, servem para bumbar nas obras, para jogar na seleção, para correr no atletismo, e para pintar algumas fotos “à la Benetton” para podermos falar da diversidade e da solidariedade. Enquanto isso, só vamos abrir portas à gente “qualificada”.

Abomino as reportagens a mostrar como os imigrantes se enquadraram bem na sociedade europeia, se aculturaram e se tornaram produtivos… é uma lógica esclavagista.

A única forma em que isto difere dos tempos do comércio triangular é que os imigrantes (guineenses neste caso - pelo menos são os que conheço) vêm para cá “voluntariamente” para serem escravizados, principalmente quando a qualificação não é académica ou atlética, mas força nos braços para limpar casas de banho e centros comercias.

Será possível falar da imigração fora de uma perspetiva capitalista e nacionalista, mas humanista?

2 de setembro de 2018

LÍDERES: O PROBLEMA DA GUINÉ-BISSAU - cronices crónicas


Quando há séculos os portugueses chegaram àquelas paragens hoje conhecidas como Guiné-Bissau e quando resolveram começar a desenvolver o negócio de escravos, foram os nossos líderes, os nossos reis (ou régulos) que tratavam de fornecer a mercadoria.

Diz-se que o régulo papel, Incinha Té, teria dito aos portugueses que queriam se instalar em Bissau e fazer um forte “que não criaria no seu quintal uma onça que depois o mataria”. Mas lá se fez o forte (depois virou Amura) e lá se criou a onça. Motivo: deram-lhe bastante prendas que hoje para nós são ninharias: tecidos vermelhos e tabaco, principalmente. Na altura, para ele, tinha feito um bom negócio.

Os líderes “guineenses” participaram no mercado de escravização, eram tão escravocratas quanto os europeus que iam à Guiné comprar pessoas. Balantas, papéis, biafadas, bijagós, fulas e mandingas vendiam-se uns aos outros e a moeda de compra era, usualmente, o tabaco. Vendiam os próprios irmãos pelo tabaco (bem, eles não se consideravam irmãos na altura, mas reinos e povos diferentes). Os povos da Guiné estavam muito bem organizados social e estruturalmente, na Crónica de Guiné, Zurara conta que eles, os portugueses, eram mortos quando desciam no território, razão porque os primeiros aventureiros tugas só nomeavam os rios e não as terras. Eles não tinham poder para entrar num território e arrebanhar pessoas para encher os navios; se isso acontecesse, faria das sociedades africanas agrupamentos desestruturadas e sociedades de animais, e não falaríamos hoje da escravatura ou da colonização, mas da domesticação.    

A ganância dos líderes de então e a estrutura do poder que os os permitia dispor do seu povo como se fosse seu pertence é que permitiram a instalação dos colonialistas na Guiné; a ganância e as quezílias entre as diferentes sociedades que habitavam esses territórios permitiram que fossem atirados uns contra os outros, pavimentando a via para a sua dominação; a ganância dos nossos líderes levou-os a alinharem-se com os colonialistas na luta contra o PAIGC ou na luta a favor do PAIGC; a ganância dos líderes levou também ao assassinato do Amílcar Cabral porque exigia um suicídio da classe.

Quando o PAIGC tomou o poder, e a liderança mudou, começou por fuzilar publicamente os líderes que se tinham aliados com os colonialistas e a tirar poder aos régulos, por achar que eles eram “não intelectuais” e não aptos para governar. Essa atitude, todavia, não era nada diferente da dos colonialistas com que lutaram ou desses próprios líderes que eles estavam a fuzilar. O PAIGC mudou-se a si mesmo com o golpe de estado de 1980, fruto da violência do poder e do poder da violência, desconfiando de si mesmo e da sua própria sombra, vai prendendo, espancando e matando pessoas pelo caminho, como aconteceu mais patentemente em 1985, em 1998 e 2009, e ainda hoje acontece. Quando um líder diz que tem poder para mandar prender e torturar e matar, quando um líder acha que por ser líder se torna a pessoa mais importante do país, e pode dispor das pessoas e do território como bem entender, percebemos que nada mudou.

A ganância de PAIGC levou o país ao seu estado de desgoverno atual. E a fome de "mandar", porque nem sequer falamos de "liderar" na Guiné, levou a que um país de cerca de 1.800.000 de habitantes tenha, em 45 anos, 45 partidos, a maior parte deles e os mais poderosos deles vindo diretamente da escola paigcista.

De 1974 até hoje, apenas a liderança mudou, o procedimento?, nada. Os régulos ainda vendem terra para benefício próprio, possuem quilómetros de terra, porque os herdaram dos seus avós e ninguém questiona. No problema de desmatamento de há uns anos, muitos régulos recebiam dinheiro e permitiam que se cortassem árvores nas zonas que dizem sob sua responsabilidade. Os régulos vendem e influenciam os votos das pessoas por quem são responsáveis, em troca de uns poucos benefícios que só aparecem durante as campanhas e que só ajudam a si próprios e não às suas gentes. Portanto, quando depois se levantam para falar mal contra os nossos governante, não lhes vejo autoridade nenhuma.

E os nossos governantes, que agregam mais poderes que os régulos? Se antes se vendia pessoas, hoje vendem os recursos naturais, vendem a terra, vendem as ilhas, vendem droga, vendem tudo. E se antes os europeus iam à Guiné comprar, hoje os nossos governantes é que vêm cá apregoar e garantir privilégios em troca do “investimento estrangeiro”.

Projetos de exploração de recursos naturais, projeto da central hidroelétrica para a Lagoa de Cufada, a turistificação dos bijagós traduzido em tirar terras aos locais, ou o projeto Augustus para Bolama, que trata aquele espaço como terra de ninguém e inabitado, são exemplos do alinhamento dos nossos líderes com o colonialismo que nunca deixou de existir e apenas mudou de capa.

Neste momento, confiantes da sua vantagem, "líderes", ou melhor, os nossos mandantes, não se preocupam muito, pois ganham muito dinheiro no processo, só que aparentemente não estudaram a história para perceber que os régulos na altura do primeiro colonialismo também não se preocupavam, porque tinham poder… até deixarem de o ter.

Eu costumava culpar apenas a Portugal pela escravatura, pois foi o que aprendi com os livros de PAIGC, até descobrir que os nossos próprios mandantes tinham tomado parte nisso. Ainda hoje, 45 anos depois, culpamos a Portugal pelos problemas da Guiné: ou porque a colonização foi má, ou porque a descolonização não foi bem feita, ou porque Portugal só se preocupa com Cabo Verde e não nos trata como "filhos"(?). 

Colocar o problema da Guiné na "descolonização" é um tanto estúpido e desrespeitoso para os que morreram para alcançar a independência (que é diferente da descolonização). Sobre culpar a Portugal por não nos tratar como "filhos", nem vou comentar... E a colonização?, claro que a colonização foi má… mas se sabemos isso, por que ainda os nossos mandantes continuam a praticá-la e a forçá-la sobre os nossos? A colonização do passado já não é uma desculpa válida. Os nossos mandantes são cúmplices na colonização que hoje se pratica. Lutamos pela independência para nos responsabilizarmos pelas nossas própria ações e devíamos fazê-lo.

Hoje culpamos o Ocidente (forças capitalistas) pelos problemas da Guiné, e sim, operam para manter a desestruturação, com o seu FMI, o seu Banco Mundial e as suas tantas ONGs e outras estratégias mais diretas, mas a verdade é que os nossos mandantes são agentes dessas forças e, como não têm estratégias para os seus povos, simplesmente se deixam enganar pelo conforto que arrecadam para si próprios... ou nem sequer podemos falar de engano, porque alguns são bem estudados e bem conscientes dos seus atos.

Os nossos líderes não se responsabilizam e não são responsabilizados pelos seus próprios atos, o problema são sempre os outros, como já tinha falado aqui (Até Quando?)

Vou parar aqui, por agora. Desenvolvo o tema mais tarde.

25 de julho de 2017

MACRON E SEUS APÓSTOLOS (CEDEAO)

Há umas semanas o famoso presidente Emmanuel Trump dizia que as mulheres mexicanas tinham muitos filhos… Peço desculpas, tenho que repetir a sentença de forma mais calma, pois ando a confundir muito estas duas figuras.

Estava a dizer, Emmanuel Macron disse que o problema da pobreza na África é as mulheres terem muitos filhos. As mulheres africanas, olhem só!, essas parideiras descerebradas que não sabem fazer nada senão receber esperma e cuspir mais pretinhos para este mundo.

Já era mau por si só se Trump… desculpem, se Macron tivesse dito que os africanos terem muitos filhos é o problema da pobreza na África, mas não, não se trata dos africanos sequer, mas das suas Evas, essas encantadoras de serpentes. Nesta única frase, Macron mostrou as suas cores, é tão oco quanto Trump e tão racista quanto Trump e Le Pen, mas não é tão honesto como estes dois, pois eles ao menos assumem-se como são.

E feminismo à parte, Macron está preocupado com a superpopulação africana porque o destino dos jovens acaba por ser a Europa, e o destino dos jovens migrantes africanos das ex-colónias (?) costuma ser o país ex-colonizador. Estranha dinâmica. Só que em vez de Macron recomendar um muro, recomenda o controlo da natalidade numa base malthusiana idiota.

Sabe Macron qual é a taxa da mortalidade na África? Só sabe que cada mulher chega a ter oito filhos, mas sabe quantos destes sobrevivem de guerras criadas na África por interesses ocidentais, inclusive da própria França? Sabe quantas morrem de doenças ou de medicamentos fora de prazo vendidos por farmacêuticas ocidentais, incluindo as francesas? Sabe Macron quantas pessoas morrem de fome, porque o governo do seu país tem de continuar a pagar à França o direito de usar Franco CFA (ex-Franco de Colónias Francesas Africanas), em vez de lhes fornecer ajuda básica? Sabe Macron quantos desses jovens das suas chamadas ex-colónias têm de fugir do seu país para França iludidos com a ideia de uma vida melhor? Claro que deste último ele sabe e bem, e é o que o procupa.

Mas falemos das ex-colónias. Quando é que as ex-colónias francesas deixaram de ser colónias? Se até hoje França está a colonizar mais territórios. Guiné-Bissau já está lá quase desde que adotámos o Franco CFA e começamos a tornarmo-nos colónia de uma colónia (colónia do Senegal, que é colónia de França). A França quando não consegue controlar, destrói. Quantas ex-colónias francesas estão em Guerra Civil e quantas já enfrentaram golpes de estado quando os seus líderes dizem que não querem alinhar com os interesses franceses? Aliás, o conflito que hoje se vive na Guiné-Bissau não adveio do jogo de influências entre França e Portugal no país?

O discurso de Macron apenas demonstra a aura colonizadora da França e a sua necessidade de controlo. Mas, isso não é sequer estranho, ou não seria Macron um neoliberal, trocado em miúdos, imperialista capitalista. Vejamos só este caso caricato, enquanto algumas ex-colónias africanas estão a pedir compensação monetária pela colonização (por exemplo a Namíbia a pressionar a Alemanha), a França encontra-se nas antípodas continuando as extorquir as ex-colónias, como se estivesse a pedir compensação por deixar de oficialmente as colonizar.

Vamulá, França é França, Macron é Macron, defendem interesses próprios. Só tínhamos de nos irritar com eles e continuarmos a tentar desenhar as nossas próprias soluções. E desta forma esta história seria facilmente varrida para os anais das crónicas de idiotices ocidentais. Mas tal não foi possível, pois eis que, de repente, um grupo de “bons alunos”, que têm a função de empurrar a agenda da França na África, a CEDEAO (gerente do Franco CFA), levanta-se e vem dizer que Macron tem razão e que vão reduzir para três o número máximo de filhos por MULHER.

Lá está de novo, MULHER, quer dizer, um homem pode engravidar dezassete mulheres, sem crise, mas ai da mulher se se engravidar mais de três vezes.

E pelo amor de deus, será que nem Macron nem a CEDEAO sabem que a economia africana não se baseia apenas na medida do PIB? Vais para um sítio onde as pessoas vivem da agricultura e agropecuária e vais medir a riqueza dessas pessoas com um 1 dólar por dia? Consigo entender que Macron não saiba, pois cresceu numa realidade e foi doutrinado com verdades próprias e aplicáveis para o seu meio, mas que os africanos da CEDEAO embarquem nesta cantiga é por demais preocupante.

Uma das razões porque eu não gosto da ideia de comemorar 25 de Maio é mesmo esta: por que comemorar o dia de África, quando a África é tão fracionada e a ideia do pan-africanismo já nem cadáver mais é? Fala-se da África como se fosse um corpo único e com ideais alinhados, quando na verdade, não se trata disso, ainda mantemos as mesmas fronteiras que os nossos senhores criaram e as nossas grandes instituições, como a CEDEAO, por exemplo, ainda dançam sob os cordéis dos interesses europeus.

Queremos uma África desenvolvida, todos falamos de uma África desenvolvida, mas não como uma África de africanos, que tenha em conta a nossa cultura e realidade. Queremos negar o que somos para sermos como os nossos senhores. Deus do céu!, o mais assustador é verificar que mais de sessenta anos depois, Frantz Fanon continua a ter razão, o preto quer ser branco.

A CEDEAO vai controlar a natalidade das mulheres africanas. Mas como? Eu sei que a China tem uma longa prática disso e podemos aprender muito com ela, mas, diabos!, até a China já está a seguir uma direção oposta.

Se a CEDEAO ainda não sabe que o problema da África não se trata da quantidade dos filhos das MULHERES, pois não são muitos filhos que geram a pobreza, mas talvez o oposto, a pobreza (no contexto socioeconómico moderno) é que gera muitos filhos… pois numa sociedade camponesa, muitos filhos significam muitos braços de trabalho e muita comida para a família… Como estava a dizer, se a CEDEAO não sabe que o problema da África não se trata disso, mas de alinhar com interesses ocidentais em detrimento do próprio continente, e também de seguir cegamente essas doutrinas ocidentais que já todos sabemos que não funcionam, então está mais que na hora de reformarem as botas.

Que a França tenha Macron, pode ser bom para a França. Mas que a Guiné-Bissau tenha CEDEAO a tentar decidir por ela, não abona a nosso favor. Espero que o nosso presidente sequer vai tentar embarcar nesta ideia abominavelmente idiota.


24 de junho de 2016

BREXIT - ADVENTO DE UMA CRISE OU REVOLUÇÃO EUROPEIA

Não preciso de avisar que este artigo é altamente especulativo.

Com o BREXIT aprovado, começa um efeito dominó que pode e, de certeza vai, ter um fim imprevisível (ou talvez tudo já tivesse sido planeado adequadamente). O imperialismo anglo-americano ganha assim novo fôlego (falta o Donald Trump ganhar no outro extremo para se relançar com renovado alento). A Libra cai, o Euro vai por arrasto, diminui-se o espaço comercial do Euro e a sua influência, o que vai fazer com o Dólar, que tem estado a perder a supremacia, volte a ganhar força e garantir a sua posição de moeda de tráfico internacional. Pontos para os EUA.

Entretanto, no referendo que tinha sido feito em 2014 sobre a saída da Escócia do Reino Unido, houve ameaças da UE de que se Escócia abandonasse o UK (Reino Unido), seria subsequentemente expulso da UE. Eles escolheram a permanência. Sentindo-se traídos agora, e considerando que a maioria votou a permanência na UE, podem agora decidir a sua saída do UK. Conseguindo isso, vão abrir um precedente que favorecerá grandemente a Catalunha e o País Basco. O que acentuará uma tendência de desintegração em toda a europa.

Se este BREXIT vier a revelar-se apenas como um jogo que o UK fez para chantagear a UE em troca de acordos mais favoráveis, será copiado por vários países, o que inevitavelmente levará a desintegração. Aliás, independentemente do que vier a revelar-se, outros países seguirão os passos do UK.

A desintegração da UE não parece ser má de todo, considerando a sua aparência atual.  A UE tem como o núcleo o capital, em vez de pessoas; subverte as vontades dos estados membros, anula a democracia desses países e governa-os com regras económicas só por ela mesma conhecidas. Quem manda na Europa são pessoas que não são votadas (DITADURA DO CAPITAL). E alguém já se esqueceu do que a UE fez à Grécia? Isso precisa mudar, é preciso alterar o núcleo da UE, e talvez este BREXIT leve a isso, a não ser que queiram deixar tudo nas mãos dos EUA novamente. 

Por isso, se se desintegrar a UE para se reconstruir, ou melhor, se se reconstruir para evitar a desintegração, será mais sólida. Mas enquanto continuar a dizer que a França não se pode sancionar por ser a França, mas Portugal é já sancionável, ou que a Grexit só é mau por causa da estratégia militar, mas o BREXIT é catastrófico, com esses dois pesos e duas medidas, continuará sempre a ser um gigante com pés de barro (pois são os povos que fazem os pés, são os povos que sustentam a política, religião, economia e tudo o mais).

O problema, todavia, é que se a UE se desestabilizar não vão ser apenas os EUA a tentarem rapiná-la, mas também a Rússia, que há muito tempo está a tentar alterar as balanças do poder e acabar com a hegemonia económica dos EUA e com a supremacia do FMI, pretendendo criar através dos BRICS, um novo núcleo de poder económico. Não que a UE ou os EUA estejam a dormir quanto a isso, porque operaram para desestabilizar tanto os BRICS como o MERCOSUL, com a Argentina nas mãos de Macri, o problema com que o Maduro tem lidar na Venezuela e o afastamento de Dilma no Brasil, entregando o poder nas mãos de direitistas pró-liberalismo-esclavagista-capitalista.

BRICS
No entanto, sendo a UE uma grande parceira dos EUA na luta contra a estabilidade da influência económica da Rússia, sob a égide do FMI, se se fragmentar a segunda, neste sistema canibal, como os EUA irão atrás dos despojos e a Rússia também, vamos ser levados a uma mais aberta nova Guerra Fria. Mas, se a UE se recuperar através de uma política menos orientada para o capital, e mais inclusiva, provavelmente sairá mais forte do que antes, pois caso contrário, vai receber um novo PLANO MARSHALL do qual vai levar outra centena de anos a tentar se livrar. Sem dizer que a sua aliança com a NATO, que só por si já é forte, solidificar-se-á ainda mais, deixando-a totalmente entregue nas mão dos senhores da Guerra (olá os EUA).


E nesta crise política e mundial que se avizinha, quem vai sair a ganhar é o FMI e o BM, porque são eles que impõem as sanções, pois são quem controlam o dinheiro, e os países, organizados ou não, vão sempre correr atrás de dinheiro, a não ser que a UE crie outra alternativa bancária, dela mesma e não submissa ao FMI, pois se os BRICS o conseguirem primeiro (e espero que consigam), a UE nunca conseguirá reerguer-se, caso vá abaixo, a não ser, talvez, com o poder militar da NATO.

Eu espero que este BREXIT se consolide numa revolução a favor da democracia e dos povos, e não se venha a verificar que é uma mera estratégia para a recuperação imperialista anglo-americana, como um contragolpe ao neo-imperialismo-germânico.

12 de maio de 2015

MONEY AS DEBT (a criação do dinheiro)

MONEY AS DEBT (Dinheiro como Dívida) é um documentário animado de 2006, feito pelo artista canadiano Paul Grignon, acerca do sistema monetário dos bancos modernos. O filme mostra o processo da criação do dinheiro pelos bancos, o seu enquadramento histórico e adverte sobre a sua insustentabilidade subsequente.

O filme tem continuações: Money as Debt II (2009) and Money as Debt III: Evolution Beyond Money (2011).

O filme introduz com uma história, A Aventura de Goldsmith (Ourives), uma breve e clara alegoria da história dos bancos, e termina identificando algumas alternativas para o sistema moderno dos bancos, tais como a nacionalização dos bancos e o pagamento dos dividendos ao público, estabelecer sistemas locais de trocas e câmbio (organismos sem fins lucrativos) ou a impressão do dinheiro pelos governos.
fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Money_as_Debt